Um encontro reuniu na tarde deste sábado (11), na Feira do Livro de Porto Alegre, dois notórios pesquisadores e contadores de história da música brasileira. De um lado do palco do Auditório Barbosa Lessa — Espaço Força e Luz, estava o jornalista e produtor musical Nelson Motta. De outro, o músico, jornalista e pesquisador Arthur de Faria.
Depois do bate-papo, Arthur iria para a praça autografar Lupicínio: Uma Biografia Musical (Arquipélago Editorial), em que resgata a trajetória do compositor desde sua infância na Ilhota. Já Motta partiria para assinar a nova edição do clássico Noites Tropicais (Harper Collins), que retrata os anos de ouro da MPB.
Em um auditório lotado, com 200 assentos ocupados, os dois participaram de um encontro intitulado De Lupicínio Rodrigues aos Anos de Ouro do Nosso Cenário Musical, em que relembraram causos e curiosidades de figuras da música brasileira.
Primeiramente, Arthur abriu a conversa com uma brincadeira:
— Ridículo estar aqui. As coisas que escrevi, você viveu. Que sorte, né?
Então, Motta lembrou do tema de sua autobiografia, De Cu pra Lua: Dramas, Comédias e Mistérios de um Rapaz de Sorte, lançada em 2020. Ele refletiu sobre o talento em não desperdiçar a sorte.
— A sorte é neutra. Não tem ética ou merecimento. Tem pessoas horríveis que são sortudas, e quem merece pode não ter — avaliou.
— Depende do que você vai fazer com a sorte. Eu nasci para curtir e compartilhar.
Com indagações de Arthur, Motta passou a falar sobre nomes da música brasileira com quem teve contato, como o produtor e cantor Aloysio de Oliveira e o produtor André Midani. A conversa, mais tarde, também passaria por nomes como Tim Bernardes e Fernanda Takai.
Motta comentou sobre o documentário Elis e Tom, Só Tinha de Ser com Você, o qual assinou o roteiro. Com direção de Roberto de Oliveira, o filme entrou em cartaz em setembro. De acordo com o jornalista, Elis não via graça em cantar bossa nova, pois ela gostava mesmo era de expor sua voz, ao contrário do canto mais contido do estilo. Já Tom não via graça em Elis, pois não gostava de "gritaria".
Conforme relatou Motta, saiu faísca no encontro entre os dois em estúdio. Porém, durante o processo, eles foram se aproximando. A música juntou os dois artistas.
— Se tivesse mais uma semana, ia rolar. Só não teve beijo na boca. Poucas vezes se viu algo assim, com assombrosas qualidade — brincou Motta.
Ele ressaltou que seu roteiro original foi estruturado como uma história de amor, de encontros e desencontros, mas que virou outro filme na montagem. Motta também discorreu sobre o envolvimento de Elis com drogas e a morte dela, a qual afastou a hipótese de suicídio.
Tim Maia foi outro tópico abordado por Motta. Para ele, o cantor ficaria feliz com o reconhecimento que ainda tem hoje, já que estava desvalorizado em seus últimos anos.
— O forte do Tim era o humor, as piadas. Também suas opiniões críticas sobre música brasileira. Quando faltava pauta em jornal, era só ligar para o Tim Maia, ja garantia uma manchete escandalosa — divertiu-se Motta.
O jornalista e escritor Eduardo Bueno, presente na plateia, questionou se não iriam falar sobre o "tricolor Lupicínio Rodrigues". Após algumas brincadeiras, Arthur discorreu sobre a relação do compositor com o Grêmio.
Para Motta, Lupicínio sempre foi um ídolo, que conseguia transformar rancor e ódio em arte:
— Sempre o achei assombroso. Era uma forma de curar a dor de corno, do sofrimento passar. Com o tempo, a dor passa, e a arte fica.
Arthur lembrou de quando conversou com Elza Soares, questionando-a sobre a regravação de Vingança.
— Perguntei se ela estava sendo irônica na interpretação. Elza respondeu: "Evidente! Como não ser irônica com aquela letra?" — relatou Arthur.
No final, Motta foi indagado sobre qual projeto queria ter realizado, mas não conseguiu. Ele respondeu que sonhava com um disco que juntasse João Gilberto e Miles Davis.
— Atualmente, com inteligência artificial, fica moleza — provocou Motta.