O encolhimentos das grandes redes livreiras balançou o mercado editorial nos últimos dois anos. Depois de Saraiva e Cultura entrarem em recuperação judicial e fecharem dezenas de lojas, a pandemia de coronavírus passou a ser temida como a pá de cal sobre o que restava das livrarias físicas. De portas fechadas, somente pequenos livreiros de calçada, com baixos custos de manutenção e capacidade de fidelizar clientes, pareciam ainda capazes de conviver em um mercado cada vez mais centralizado das vendas pela internet.
Um caminho do meio está sendo trilhado agora por novos grupos de varejistas. Com administração regionalizada, contratos diferenciados com shoppings e sem pressa para crescer, novas redes têm ocupado o espaço deixado pelos conglomerados que encolheram.
"Ocupar espaço", nesse caso, tem sentido literal: a Livraria Santos, por exemplo, abriu sua mais nova loja na sala desocupada pela Saraiva no Park Shopping Canoas. A inauguração foi em novembro, com a pandemia em aceleração, o que poderia desmotivar a visita de lojas físicas. Para Jonatas Santos, fundador da rede, o momento foi bastante oportuno. Ele assegura que o mercado não está desaquecido por conta do coronavírus:
— O final de ano representa um momento muito importante para as livrarias, com as compras de Natal. Por isso, resolvemos não esperar para abrir. Ficamos muito satisfeitos com o resultado. Estamos retomando o patamar de vendas em todas nossas lojas.
A rede gaúcha, que conta atualmente com nove lojas, é mais um exemplo de uma tendência de mercado que se repete em todo o país. É o que explica Leonardo Neto, autor do livro 100 Nomes da Edição no Brasil, especialista em mercado editorial:
— As grandes redes cresceram de maneira desordenada, impulsionada muitas vezes por empréstimos bancários. As consequências foram desastrosas. As redes médias agora estão investindo com maior segurança, com capital próprio. É um crescimento com os pés no chão.
Espaço para crescer não falta. A Saraiva, por exemplo, chegou a ter 112 lojas. Agora conta com apenas 28. Estamos diante da ocupação de um vazio deixado pela maior varejista do setor no Brasil. Quem está entrando nesse jogo acredita que o público vai se sentir órfão das redes anteriores e buscará outra livraria no mesmo lugar.
Além de investir com maior segurança financeira, Santos aponta que os livreiros precisam negociar de maneira diferenciada com os shoppings:
— As grandes redes tinham muitas lojas que operavam no negativo e contratos muito ruins. Os shoppings precisam entender que é importante ter uma livraria no seu conjunto de lojas, mas que a circulação de público é menor do que a dos restaurantes e das lojas de vestuário, por exemplo. Nossa rede só entra onde é possível negociar com os administradores.
Santos também é cuidadoso em relação à expansão além dos limites do RS:
— Já recebi convites para sair do Estado. Não aceitei. Só tenho lojas em cidades que posso visitar com frequência e que são chefiadas por quem tenho confiança.
Diferentemente da Santos, a rede Leitura, de Minas Gerais, tem trabalhado com uma postura mais agressiva de crescimento. Em março, o grupo deve abrir sua primeira loja no RS, no espaço deixado pela Saraiva do BarraShoppingSul. No entanto, para avançar, a rede tem trabalhado com gerentes que se tornam sócios do grupo.
— Éramos líderes em diferentes regiões do Brasil. Dávamos preferência por investir em áreas que historicamente tinham carência de livrarias. Mas, há cerca de três anos, com o fechamento de várias lojas de outros livreiros, percebemos que era momento de entrar em São Paulo, Rio e, agora, no Sul — conta Marcus Teles, presidente da Leitura.
A loja de Porto Alegre será a 83ª do grupo, consolidando a Leitura como a maior rede do país. No entanto, Teles aponta que a época de lojas opulentas ficou para trás:
— A tendência é de que lojas muito exageradas sejam reduzidas. O mercado vai se adaptando. Investimos com recursos próprios, de modo equilibrado. No ano passado, mesmo com a pandemia, fechamos o ano no azul. Nosso objetivo é crescer de maneira sólida e equilibrada.