Em clima de melancolia e "quero mais", a 63ª Feira do Livro de Porto Alegre terminou na noite deste domingo (19) com a caminhada de despedida, na qual rosas vermelhas foram distribuídas a livreiros, como um singelo gesto de afeto. A procissão foi liderada pela patrona desta edição, Valesca de Assis, acompanhada por família e personagens de contos infantis, ao som de Está Chegando a Hora.
No entanto, a atmosfera festiva que marcou a atividade contrastou com a decepção de vendedores, que esperam queda nas vendas de 20% a 50% em relação a 2016. Em entrevista ao GaúchaZH mais cedo, Marco Cena Lopes, presidente da Câmara Rio-Grandense do Livro (CRL), entidade que organiza o evento, afirmou que a projeção de queda é de 14%.
A caminhada de cerca de 45 minutos começou na Tenda de Pasárgada e terminou na Praça de Autógrafos. O clima era de Carnaval, com um bloco de samba marcando os ritmos com tambores, trompetes e cavaquinhos, e uma multidão dançando logo atrás. Livreiros e funcionários esperavam a patrona e sua legião com um sorriso. Muitos se curvavam, em reverência, ao receberem a rosa vermelha. Em frente ao Museu de Arte do Rio Grande do Sul (Margs), a marcha recebeu o ex-governador Olívio Dutra, saudado com gritos e abraços.
Ao fazer um balanço da Feira deste ano, Valesca reconhece a queda nas vendas, mas ressalta o impacto positivo do evento ao estimular a leitura, contribuir para a melhora na educação e elevar a autoestima das pessoas.
— Não é mais uma feira de livro, somente. É um acontecimento social e cultural, de contato com a literatura, a música e a dança. Financeiramente, não devemos ultrapassar as vendas do ano passado. Mas estamos muito satisfeitos, foi uma feira muito alegre, com um astral muito bom. Ninguém imagina Porto Alegre sem ela. O Mario Vargas Llosa diz que a literatura pode ser um remédio ou dar esperança. É a única possibilidade barata que pode salvar o país — avalia.
Para os livreiros, no entanto, o clima é menos positivo. Todas os vendedores ou donos de bancas que GaúchaZH ouviu afirmaram que a feira deste ano foi pior do que a anterior. Luís Alberto Araújo, supervisor comercial da editora Artes e Ofícios, suspeita que sua banca vendeu 50% a menos do que no ano anterior.
— Foi bem mais fraca. A questão econômica afetou muito — lamentou.
Denise Pisoni, supervisora de vendas da Editora Cassol, focada em literatura infanto-juvenil, disse que a falta de investimentos nas escolas públicas, sobretudo no transporte de estudantes, culminou em menos caravanas de jovens à Feira.
— As escolas do Interior quase não vieram neste ano e a programação também foi menor, devido ao espaço mais enxuto da área infantil. Isso limitou a vinda de pessoas. Houve redução de valores de cerca de 20% na nossa banca, mas esperávamos que chegaria a 40% — afirmou.
Norberto Guedes, responsável pela banca Nova Era, do mesmo segmento, projeta que houve redução de 30% nas vendas — a expectativa era manter o desempenho do ano passado.
— O povo está sem dinheiro. Todos os nossos livros estão com 20% de desconto. Mesmo assim, houve um "chorinho" para baixar ainda mais o preço e parcelar em mais vezes. E olha que tempo ajudou. Esperávamos que mais pessoas viriam hoje — salientou.
Quem aproveitou o último dia para conseguir desconto foi a executiva Ana Feijó, 39 anos, que trouxe a filha de cinco anos na expectativa de incentivar a leitura.
— Estou negociando. Eles estão baixando o preço neste final de feira. Acho que foi uma boa aposta vir aqui. Recém cheguei e comprei dois livros. Mas vou comprar mais — disse.