Atualização (24/8, às 13h47min): Após a publicação desta matéria, a sessão de sábado (27), às 17h, foi cancelada. Ainda haverá sessões na sexta (26) e no sábado (27), sempre às 21h. O texto abaixo foi atualizado.
Após um hiato de oito anos, Vingança - O Musical retorna à cidade-berço de Lupicínio Rodrigues, cujas músicas inspiraram o espetáculo, e onde também havia encerrado suas apresentações. Com elenco e foco renovados na reestreia, a peça desvela uma ciranda de paixões ao mesmo tempo em que aborda questões sensíveis, como o machismo. As exibições serão realizadas no Theatro São Pedro, em Porto Alegre, nesta sexta-feira (26) e no sábado (27), sempre às 21h (veja serviço ao final do texto).
— Fomos acolhidos lindamente da outra vez, e eu espero que essa nossa volta também seja bem acolhida. Estamos muito, muito felizes de estar aí — conta a atriz, cantora, dramaturga e autora do musical, Anna Toledo.
O melodrama, com duração de uma hora e meia, é constituído apenas por músicas de Lupicínio, um dos maiores nomes do samba-canção e o responsável pela expressão "dor de cotovelo". As canções se encaixam no espetáculo, composto a partir delas e das situações em que poderiam surgir. A direção-geral é de André Dias e a direção musical fica por conta de Guilherme Terra, com arranjos originais pensados para as vozes dos atores e de modo que façam sentido dramatúrgico. As canções são executadas ao vivo com piano, violão e percussão.
Inalterada, a trama versa sobre três triângulos amorosos e conversa diretamente com os temas das músicas do compositor gaúcho: amores não correspondidos, ciúmes, traições e vingança.
Anna Toledo (Luzita), Danilo de Moura (Alves), Jonathas Joba (Liduíno), Lola Fanucchi (Maria Rosa), Maria Bia (Linda) e Sérgio Ruffino (Orlando) interpretam os seis personagens que compõem o espetáculo — arquétipos que podem ser reconhecidos pelo público: o boêmio com vida dupla; a esposa que fica em casa esperando esse homem chegar; a mulher fatal, uma dançarina de cabaré com quem esse boêmio se relaciona, que também tem outro amante — um bicheiro que a protege e não sabe do outro caso; o dono do cabaré; e a cantora do cabaré, que também trabalha na casa da família como empregada durante o dia. Esses mundos se esbarram ao ponto de atingir um nível perigoso, colocando em risco a sua manutenção — até descobrir-se que todos têm algum segredo.
— É bem interessante de acompanhar, porque você começa achando que entendeu tudo e, quando vê, a história é muito mais emaranhada do que parece — adianta a autora.
Sucesso nos palcos
O espetáculo estreou em 2013, em São Paulo, onde teve quatro temporadas, e encerrou em Porto Alegre em 2014, no festival Porto Alegre em Cena, incluindo uma apresentação no centenário do nascimento de Lupicínio Rodrigues — um momento de "êxtase", como descreve a autora. Com o sucesso do musical, vieram diversas indicações e conquistas de prêmios e pedidos de fãs para mais temporadas. A peça resultou ainda na gravação de um álbum com as músicas e na publicação de um livro, o que também garantiu uma vida mais longa ao espetáculo. Além disso, escolas de teatro o reproduzem pelo Brasil, mostrando que ainda há interesse pela obra.
Ao longo dos anos, o grupo manteve o desejo de dar seguimento às apresentações de Vingança. Assim, percebendo que ainda havia potencial, os artistas decidiram retomar o espetáculo. A decisão também foi motivada pela curiosidade do elenco em ver como a peça de época soaria hoje ao público. A nova temporada, novamente em exibição em São Paulo, também está tendo boa repercussão.
— A gente está apresentando para uma geração nova esse repertório e também está provocando novamente as pessoas que conheciam, mas de casa, dos avós. São músicas que têm um efeito emocional muito forte — afirma Anna, ressaltando que Vingança tem um público diverso, do maduro ao jovem, passando também por pessoas que nunca ouviram Lupicínio.
Além do público, parte do elenco foi renovada. Da formação original, restam Anna, Joba e Ruffino. Danilo de Moura, um dos novos colegas, intérprete de Alves, revela que era um grande fã da peça e que chegou a assisti-la seis vezes na primeira montagem. O ator descreve seu personagem como machista e o classifica como distante de tudo o que é e que já viveu nos palcos.
Moura revela que o público pode esperar comprometimento e qualidade técnica do musical. Ele também ressalta que está empolgado para encenar a peça em Porto Alegre, onde já se apresentou em outras produções e ama trabalhar:
— A expectativa está lá no alto. O pessoal já fez a peça aí, e eu ainda não. Quero mostrar meu gogó para vocês (risos).
Além de ter enfrentado o desafio de escrever o musical, Anna atua no espetáculo. A atriz conta que se sentiu receosa em voltar ao papel, pois havia seguido adiante com a carreira e por ter medo de estragar uma "lembrança perfeita":
— Tinha sido uma memória tão boa. Mas eu tomei coragem e fui. E foi muito legal, porque descobri que tenho coisas a acrescentar ainda, que esses anos foram bons em termos de bagagem e que me deram mais recursos para representar a Luzita com a garra que ela merece. Eu acabei ficando muito satisfeita de voltar ao papel apesar ou com o medo todo que eu estava sentindo.
Inspiração
Fã de Lupicínio Rodrigues, a cantora já tinha grande familiaridade com sua obra, tendo gravado um disco com canções do compositor, além de fazer shows com samba-canção. Quando surgiu a vontade de fazer uma peça de teatro musical, foi apenas natural escolhê-lo como inspiração. De seu desejo de dramatizar as músicas, que considera um tesouro, nasce a história original de Vingança, um melodrama sem elementos biográficos, com ambientação nos anos 1950, época em que as canções foram compostas.
— É um autor que eu acho interessantíssimo, a verve dele, o bom humor, a maneira como ele fala da vida, como ele é um cronista interessante do seu tempo, dos seus costumes e com uma melodia maravilhosa — destaca Anna.
A atriz confessa que apresentar a peça em Porto Alegre, no dia do centenário de nascimento do artista, foi uma das maiores emoções de sua vida. Por esse motivo, chega a perder o sono por voltar à Capital.
— Foi uma das coisas mais lindas que já me aconteceram. A gente recebeu muito carinho. Eu tinha muito medo, claro, né? Pô, vou cantar Lupicínio para os gaúchos, pelo amor de Deus, quem sou eu? Mas a gente faz com tanto amor, com tanto respeito, reverência e gratidão pela obra, que eu acho que isso é entendido — salienta.
Mudança de foco
A experiência de apresentar Vingança, desta vez, está sendo diferente. Na época de sua estreia, o foco principal estava em Lupicínio e sua obra e em colocá-los de novo em evidência, mostrando o quanto eram interessantes do ponto de vista dramatúrgico e cultural. Agora que isso já foi superado, o espetáculo atinge a próxima etapa, que é a discussão central da peça: a questão de como as mulheres são sobreviventes e vivem em um mundo de homens, jogando com as regras deles, mas com as cartas que têm. A obra toca em questões como o machismo, a violência e as várias formas de abuso. Os temas, atualmente, sensibilizam mais o público.
— A gente recebe muito feedback da plateia de "nossa, isso é para se pensar". Até os homens do elenco falam: "Preciso rever algumas coisas do meu comportamento". Então, acho que ela também está promovendo esse tipo de reflexão. Principalmente essa questão de como incomoda mais hoje ver a maneira como as mulheres eram tratadas do que há 10 anos. Alguns tipos de piadas ou de brincadeiras são cada vez menos toleradas — aponta Anna.
Moura concorda:
— Enquanto obra, acho que conseguimos enxergar em Vingança traços que nós ainda repetimos, mesmo após 70 anos, de personagens que são pessoas que não condizem mais com a nossa época.
O objetivo do musical, conforme os artistas, é emocionar o público e provocá-lo a questionar essas situações.
"Vingança - O Musical"
- Nesta sexta-feira (26) e no sábado (27), sempre às 21h.
- Theatro São Pedro (Praça Marechal Deodoro, s/n°, Centro Histórico), em Porto Alegre.
- Ingressos a partir de R$ 50, à venda pelo site.
- Desconto de 50% para sócios do Clube do Assinante e um acompanhante.