Assim que se mudou de Lavras do Sul com a família para Porto Alegre, em 1954, Paulo José, morto nesta quarta-feira (10), aos 84 anos, reavivou sua paixão pelo teatro. Ainda cursando o científico no colégio Nossa Senhora do Rosário, conheceu o teatro dos universitários da União Nacional dos Estudantes (UNE), que reunia nomes como Antônio Abujamra, Fernando Peixoto, Luís Carlos Maciel e Lineu Dias. Seu primeiro trabalho com esse grupo foi na peça chamada Primeira Folha entre o Vermute e a Sopa, de Artur Azevedo.
Paulo José abandonou a faculdade de Arquitetura na UFRGS em 1958 e formou o Teatro de Equipe com, entre outros nomes, Paulo César Peréio, Luis Carlos Maciel, Ivette Brandalise, Milton Mattos, Mario de Almeida, Ittala Nandi e Nilda Maria. O grupo marcou presença na Capital acolhendo e irradiando tanto a experimentação cênica quanto o debate político, apresentando montagens antológicas de peças como Esperando Godot (de Beckett), Pedro Mico (de Antônio Callado) e O Despacho (do próprio Mario de Almeida). Em 2003, na ocasião do lançamento do livro Trem de Volta – Teatro de Equipe, de Mario de Almeida e Rafael Guimaraens, Paulo José lembrou à reportagem de GZH o espetáculo do grupo que marcou sua estreia na direção:
— O fato de ser meu primeiro trabalho como diretor e trazer o ano de sua realização no título, 58, fez de Rondó 58 um momento de fácil localização no tempo, um marco em minha vida, um divisor de memórias. Todas as minhas lembranças passaram a ser referidas como antes e depois do Rondó.
Um novo e largo passo profissional foi dado com seu ingresso no Teatro de Arena, em São Paulo, em 1961. No grupo ele conheceu a atriz Dina Sfat, com quem se casou em 1968 e teve três filhas.
Com o golpe militar de 1964 e o acirramento da censura, os grupos teatrais politicamente mais engajados foram dispersados — o Teatro de Arena encerrou suas atividades em 1969. Ao longo das décadas seguintes, Paulo José voltou-se mais para trabalhos como ator e diretor na televisão. Em 1987, ele ganhou o prêmio Molière por sua atuação na peça Delicadas Torturas, peça de Harry Kondoleon, sob a direção de Ticiana Studart. Em 2002, deu início a uma bem-sucedida parceria com o Grupo Galpão, de Belo Horizonte (MG), uma das mais destacada companhias cênicas do país, trabalhando como diretor convidado e pesquisador.
Em 2009, após um afastamento de nove anos dos palcos, Paulo José retornou ao teatro atuando e dirigindo a filha Ana Kutner na peça Um Navio no Espaço ou Ana Cristina César, com texto de Maria Helena Kühner baseado nos poemas e escritos de Ana Cristina César (1952-1983), que se suicidou aos 31 anos. Neste trabalho, interpretou a si próprio, como um leitor que refaz a trajetória literária e existencial de Ana Cristina César, com quem ele conviveu profissionalmente na Globo. Em 2011, Paulo José voltou a dirigir Ana, e também Bel Kutner, no espetáculo Histórias de Amor Líquido, com texto adaptado da obra do sociólogo polonês Zygmunt Bauman. Estes dois espetáculos foram apresentados em Porto Alegre, respectivamente, em 2010 e 2011.