A partir de 2022, uma gaúcha terá a responsabilidade de ajudar a escolher os filmes e séries que serão vencedores de um dos maiores prêmios do entretenimento: o Globo de Ouro. A jornalista Miriam Spritzer, nascida em Porto Alegre e moradora de Nova York, nos Estados Unidos, passou a integrar a Associação de Imprensa Estrangeira de Hollywood (HFPA, na sigla em inglês), entidade responsável pela cerimônia que premia os grandes nomes do entretenimento mundial.
Agora, ela representa o Brasil dentro da organização ao lado das veteranas Ana Maria Bahiana e Paoula Abou-Jaoudé, além de Jânio Carlos Vieira Nazareth, que também é novo integrante da associação.
— Eu sou a única gaúcha na associação. Tem os argentinos, mas não conta, né? — brinca Miriam, em entrevista a GZH. — Posso não ser a primeira brasileira, mas sou a primeira gaúcha a votar no Globo de Ouro.
Aos 36 anos, a jornalista já possui uma carreira internacional e é responsável por entrevistar diversas personalidades de Hollywood. "Sempre sorridente", como ela mesma se adjetiva, a comunicadora virou presença frequente nos tapetes vermelhos dos quais os cinéfilos apenas sonham em chegar perto. Assim, ela acumula conversas com os mais variados artistas, de Oprah Winfrey a Scarlett Johansson.
De Porto Alegre a Nova York
Filha dos médicos Nelson e Thays Spritzer — os quais ela acredita que pensam "como a gente fez isso?", quando olham para os rumos que a caçula tomou —, Miriam sempre foi aficionada por arte. E a sua paixão por cinema vem desde criança, quando, segundo ela, a família toda ia até a Espaço Vídeo alugar filmes no final de semana. Ela, então, tinha direito a pegar um título para si — não era raro repetir longas, como A Noviça Rebelde e As Patricinhas de Beverly Hills.
Encantada por aqueles mundos, foi para Nova York para ter a vida cultural que sonhava, rodeada de teatro, música e arte. Não queria ficar restrita apenas a ser espectadora. O objetivo era estar dentro daquele universo cheio de música e dança.
— Quando vim para Nova York, achava que iria ser uma atriz da Broadway, que, hoje, já estaria com o meu quinto Tony Award e, se bobear, com um Oscar. Quem sabe, um Globo de Ouro. Nunca pensei que iria trabalhar na área da comunicação — recorda ela.
Nascida no bairro Moinhos de Vento, Miriam se criou no Rio Branco e, depois, migrou para o Bela Vista. Estudou no Colégio Israelita Brasileiro e, mesmo cantante e dançante, acabou cursando Administração na ESPM. A graduação em Jornalismo só aconteceu depois, nos Estados Unidos, na Universidade de Nova York, quando se mudou de mala e cuia para lá.
— O que eu queria cobrir, mesmo, era teatro musical, a Broadway. Mas como eles não davam muita abertura para a mídia internacional, acabei encontrando muito mais trabalho na área dos filmes. Fui crescendo nesse tipo de cobertura por puro acaso. Agora, sou parte da Associação de Imprensa Estrangeira de Hollywood. É bem surpreendente pensar que hoje estou nesta posição, lidando com pessoas que eu admirei a minha vida inteira, sejam os meus entrevistados ou os colegas com quem trabalho lado a lado — conta Miriam, que escreve para revistas como Versatille, L'Officiel, Harper's Bazaar Brasil e Marie Claire.
Mudanças
A comunicadora, que reside em solo norte-americano desde 2010, faz parte da turma de 21 novos membros da HFPA, que busca mais diversidade para contornar uma grave crise de imagem pela qual o Globo de Ouro passa, após o jornal Los Angeles Times ter realizado uma investigação que constatou que, dos 87 membros, nenhum era negro. Além disso, também foram colocadas em xeque questões éticas a respeito do relacionamento estreito entre a entidade e os estúdios de cinema, o que poderia influenciar os votos dos membros.
A polêmica fez com que alguns vencedores do Globo de Ouro renegassem o prêmio e, inclusive, levou a emissora NBC a cancelar a transmissão da edição de 2022 da premiação. Porém, a associação começou a tentar consertar os erros do passado. Com os acréscimos — e algumas expulsões —, passou a contar com 105 membros, o que traz mais vozes para as decisões. Entre os novos integrantes, quase metade é de mulheres e seis são negros. A lista deve aumentar no ano que vem.
A ida de Miriam para a HFPA foi, assim como a sua jornada no cinema, inesperada. Quando o presidente de uma associação de estrangeiros da qual a jornalista já fazia parte foi procurado pela organizadora do Globo de Ouro, com o objetivo de saber quais membros poderiam se encaixar na entidade, apenas uma das profissionais se enquadrava: a gaúcha. Assim, em 24 horas, a guria de Porto Alegre precisou organizar toda a sua documentação, conseguir cartas de recomendação, ajustar o seu portfólio e comprovar que morava onde dizia. No final, a correria valeu a pena.
Faz apenas três semanas que ela foi aceita na HFPA, mas a comunicadora já relata que eles estão "fazendo o tema de casa" e que a entidade realmente abre as portas para os estrangeiros terem acesso a eventos, entrevistas e espaços que são frequentados com facilidade por profissionais locais.
Miriam ainda reforça que as regras do Globo de Ouro realmente limitavam a entrada de novos membros, como a questão de que só eram aceitos os profissionais que moravam em Los Angeles. Mas ela também destaca que a falta de representatividade vem justamente da falta de investimento dos veículos em manter profissionais focados em entretenimento morando fora.
— Que país pobre, por exemplo, vai conseguir manter um correspondente internacional que só trabalhe com entretenimento em Los Angeles? Não tem. E uma das críticas sobre o Globo de Ouro falava justamente disso: os países latinos e os africanos não estão presentes. Mas mal os jornalistas americanos conseguem trabalhar só com entretenimento, então imagina dos outros países — diz a jornalista.
De acordo com ela, o Globo de Ouro sempre teve um papel importante para o cinema internacional, "porque quem vota ali é estrangeiro, representa o mundo". E, com as mudanças, a jornalista acredita que a premiação voltará a ter o prestígio e a importância de outrora.
— É uma grande responsabilidade, porque vou ter que assistir a absolutamente tudo. Não dá mais para ver algo e votar porque eu gosto de fulano ou de cicrano. O meu voto vai fazer diferença. Passam mil coisas na cabeça e, para mim, é uma honra fazer parte disso, mas também é algo que eu levo muito a sério. É algo que eu quero fazer corretamente, assistir a tudo. Chegar até a HFPA me fez comprovar que sou uma boa comunicadora e que sou boa no que eu faço, mas agora tenho que mostrar serviço — diz.