Um espetáculo visual misturado com reflexão política, misticismo, efeitos especiais impressionantes, um elenco talentoso e estelar, direção de um dos cineastas mais promissores de sua geração, o canadense Denis Villeneuve, e areia. Muita areia. Este é o resumo de Duna, filme que chega aos cinemas nesta quinta-feira (21) e promete ser o primeiro capítulo de uma franquia com muito potencial.
O longa adapta a obra homônima de Frank Herbert, considerado um dos maiores escritores de ficção cientifica de todos os tempos. O livro original, que atravessa gerações, vendeu mais de 22 milhões de cópias desde que foi lançado, em 1965. E foi o responsável por inspirar produções que são marcos da cultura pop, como a multibilionária franquia Star Wars — inclusive, em um primeiro momento, a Voz e a Força parecem bem semelhantes.
Porém, a saga criada por Herbert nunca recebeu uma adaptação cinematográfica digna de sua importância. Nos anos 1970, o diretor chileno Alejandro Jodorowsky quase levou a obra para as telas em uma produção que prometia a grandiosidade merecida. Porém, por falta de verba, o título foi cancelado e se tornou "o maior filme que nunca aconteceu". Mesmo assim, Hollywood sabia que Duna tinha potencial e, em 1984, David Lynch comandou a primeira versão.
O longa, no entanto, decepcionou não somente os fãs de Herbert, mas também a maioria das pessoas que possuíam o mínimo de interesse por cinema. Narrativa confusa, visual estranho e um ritmo apressado foram a receita do fracasso, que afastou o livro da sétima arte por 37 anos — duas minisséries foram produzidas para a televisão no começo dos anos 2000, mas caíram no esquecimento por conta de sua insignificância.
Felizmente, as areias do tempo agiram e Duna, finalmente, chegou aos cinemas como deveria: em escala épica. A espera valeu a pena.
A trama de Duna acompanha a poderosa família Atreides, que é designada pelo império para administrar Arrakis, planeta de onde é extraída uma substância que possibilita que naves possam realizar longas viagens espaciais e, também, é capaz de aumentar a longevidade humana. Chamado de "especiaria", o produto é retirado do deserto, onde vivem o povo originário e os temidos vermes gigantes da areia.
A invasão dos estrangeiros causa sofrimento aos nativos, uma vez que exploram a terra, semeiam destruição e vão embora. Porém, ao contrário de seus antecessores, os Atreides pretendem desenvolver Arrakis e não apenas se aproveitar do planeta. Forças contrárias, no entanto, querem o controle do local e todo o poder que vem com ele.
Assim, o duque Leto Atreides (Oscar Isaac) vai para Arrakis com o filho Paul (Timothée Chalamet) e Lady Jessica (Rebecca Ferguson), mãe do jovem e uma Bene Gesserit — importante ordem religiosa que está por trás do sistema político do universo conhecido. Uma reviravolta muda o rumo da família e o jovem Paul embarca em uma jornada de descoberta e de sobrevivência pelo deserto em busca dos Fremen, nativos do planeta.
O efeito Villeneuve
Sob comando de Denis Villeneuve, cineasta que consegue desenvolver o seu lado autoral mesmo em grandes produções, como Blade Runner 2049 (2017) e A Chegada (2016), o novo Duna consegue cumprir a função de adaptar uma das obras mais difíceis de serem transpostas para o audiovisual, sendo fiel a muitas passagens do livro de Herbert — para o bem e para o mal. O lado bom, é claro, é poder apreciar um filme que respeita o legado do autor e a sua visão sobre um futuro distópico. Porém, quem procura uma trama mais frenética pode se decepcionar.
Com duas horas e 35 minutos de duração, Duna não tem pressa para contar a sua história — principalmente nos primeiros 50 minutos. O roteiro da adaptação, escrito pelo próprio Villeneuve, ao lado de Eric Roth (vencedor do Oscar por Forrest Gump: O Contador de Histórias) e Jon Spaihts (Doutor Estranho), sequer tem pretensão de encerrar a trama. Ele é literalmente o primeiro capítulo de uma franquia que, apesar de ainda não ter recebido o aval para ganhar uma continuação, tem esse objetivo. E isso já fica explícito na abertura do filme, que recebe um subtítulo dizendo “Primeira Parte”.
O diretor e seu time conseguem trazer uma abordagem bem interessante sobre a questão dos invasores estrangeiros em território nativo em busca da especiaria, a qual o filme chama de “substância mais valiosa do universo”. Existe uma crítica na forma como o cineasta registra aqueles momentos. Na sua visão, não há humanidade na exploração em busca de enriquecimento e poder. E quem tenta conciliar o progresso com o bem-estar do povo está condenado. Não é coincidência que as naves se parecem com gafanhotos, conhecidos por destruírem plantações e ecossistemas. São pragas.
Além das mensagens, Duna tem muitos outros atributos. Não tem um elenco estelar apenas para chamar o público para o cinema, as atuações são convincentes — em especial de Chalamet e Ferguson, mãe e filho que compartilham de dons sobrenaturais —, há também uma trilha sonora imponente e marcante de Hans Zimmer e uma fotografia deslumbrante de Greig Fraser, que dá o tom de Duna, trabalho importantíssimo para a imersão do espectador na aventura.
Ao final das contas, Duna é um dos grandes filmes do ano, apesar de não concluir a sua mensagem. Tanto Villeneuve quanto Paul Atreides têm uma visão única do futuro. Que ele seja grandioso, como esta franquia merece.