Um sonar, um radar, um aparelho de ultrassom. A primeira impressão de Ad Astra, novo filme de James Gray, chega pelos ouvidos.
Na produção assinada pelo brasileiro Rodrigo Teixeira, o astronauta Roy McBride, personagem de Brad Pitt, recebe a missão ultrassecreta de procurar pelo pai, que não vê desde a adolescência. O filme teve estreia mundial nesta quinta-feira (29), no Festival de Veneza.
Lenda da exploração espacial, Clifford McBride, vivido por Tommy Lee Jones, pode estar vivo nos confins do Sistema Solar — e por trás de panes energéticas generalizadas que atingem a Terra, causando prejuízos e mortes.
A ideia central do filme, diz Gray por telefone, duas semanas antes do festival italiano, "era o renascimento de Roy". A ameaça à Terra, que motiva a jornada do astronauta, "é só a premissa, só a superfície".
Por isso, a evocação do ultrassom no início e outras alusões a um parto, em distintos momentos da trama — que, reafirma Gray, não é sobre "deter esse desastre terrível".
— É um filme sobre um pai e um filho, sobre a possibilidade de reparação, de seguir com a própria vida. Uma ideia bem mais centrada na emoção do que seria no caso de um filme-catástrofe.
A odisseia de Roy se passa num tempo próximo do presente, que é retratado sem qualquer traço de pirotecnia. Gray diz que houve um "esforço consciente" por evitar um mundo hipertecnológico.
— Falar da capacidade de ir mais e mais longe no espaço com melhores formas de propulsão ou sei lá o que seria só uma distração.
A sobriedade geral de Ad Astra se estende ao comportamento dos personagens, em especial ao do protagonista. Roy McBride é o exemplo acabado da contenção. Seu pulso nunca dispara, nem nas situações mais assustadoras. No início do longa, ele sobrevive ao despencar de uma megaestrutura afetada pela tal pane elétrica.
Se o coração do personagem de Pitt não acelera, o mesmo não se diz dos batimentos do espectador. Ad Astra tem sua cota de sustos e tensão. Mas tampouco é esse o tipo de emoção que Gray persegue.
— Sófocles e Shakespeare ainda nos comovem, pela emoção humana. Queríamos nos concentrar na conexão, ou falta de conexão, entre seres humanos — diz. E acrescenta: — Também não queríamos bancar os exibidos.
As relações humanas estão no cerne da filmografia de Gray — seja na forma de histórias de amor, de gangues ou de imigrantes, que se passam, quase todas, em Nova York, e sempre escritas por ele, para quem "o roteiro é o aspecto individual de maior importância num filme".
— Sempre escrevi meu próprio material porque é a maneira de ser o mais pessoal possível, de não pôr uma barreira entre mim e o filme — diz o diretor.
Seria o caso de perguntar por que ir tão longe para contar uma história que, no fim das contas, não precisaria se passar em meio aos astros.
— É uma história de abandono, e a vastidão do espaço surge como uma metáfora perfeita para a vastidão e o mistério da nossa alma — afirma Gray.
Ad Astra significa "rumo às estrelas". O nome do filme foi tomado da expressão latina "per asper ad astra", ou por árduos caminhos até as estrelas. Mas também poderia evocar "ad astra et ultra" — aos astros e além. Este talvez pudesse ser o lema do personagem Clifford McBride, que, em seu afã por descobrir o universo e saber se estamos sós nele, deixa para trás a Terra e a família.
Rumo às Estrelas é ainda o subtítulo que a produção terá ao estrear no Brasil, em 26 de setembro. O país, pelo qual Gray se diz apaixonado, é o único que o cineasta visitará para lançar o longa, produzido pela RT Features, de Rodrigo Teixeira.