— É uma cobra? — questiona uma transeunte.
— O que são esses bichos? — pergunta outra.
Na tarde desta terça-feira (19), duas cobras gigantescas que emergiam do espelho d’água da Redenção não passaram despercebidas. Todos que transitavam pelo local, de um jeito ou de outro, ficavam impactados. Alguns, olhavam com curiosidade e seguiam o seu trajeto. Outros, paravam a sua caminhada ou pedalada e circulavam a instalação tentando entender do que se tratavam aqueles seres enormes. Compreendendo ou não o significado, a maioria decidia tirar uma foto.
Rita Piven, aposentada, que andava de bicicleta pelo parque, chega perto da reportagem e pergunta:
— Posso pedir um favor? Tira uma foto minha para eu mandar para a minha filha que mora em San Diego? Mas pega a bicicleta e as cobras no fundo. As duas.
Ela conta que assistiu, mais cedo, na televisão, uma matéria sobre a instalação artística e decidiu ir até o local ver os bichos de perto. E aprovou a obra, classificando-a como “maravilhosa”.
As cobras que estão na Redenção compõem a obra Entidades, do artista indígena roraimense Jaider Esbell. Representando a fertilidade e a fartura, os animais gigantes, na simbologia do povo Makuxi, trabalham incessantemente para proteger, alertar e manter vivos os povos originários. As criaturas que eram, originalmente, uma pintura foram transformadas em balões luminosos e estarão esperando pela visita do público até o próximo dia 31, dentro da programação do 28º Porto Alegre em Cena.
A social media Mylena Borges, que se abaixava próxima à água, procurando o melhor ângulo para fazer uma foto das cobras com o seu celular, não sabia que a instalação estaria na Redenção até deparar com ela.
— Achei incrível. Amo quando tem umas intervenções assim, saindo do normal — conta ela.
Gerações
Antônio Carlos Brock, aposentado, passou de manhã pelo espelho d’água. Achou curioso e decidiu ir em casa buscar o neto Pietro, de cinco anos, que veio de Canoas visitar o avô, para ir ver as criaturas gigantes que saíam das águas.
— Não entendi bem o significado, mas achei muito bonito. Movimenta a cultura, o comércio. Pessoal tá todo admirando, tirando foto — ressalta Brock.
Perguntado se não tinha medo das cobras, Pietro diz:
— Não, achei muito legal. Mas, de verdade, bem “gandi”, eu tenho medo.
Outra família, representada por três gerações, também ficou curiosa com as criaturas. A aposentada Nora Muller, acompanhada da filha Tielle e da neta Maria Tereza, de três meses, tentavam entender o que a obra representava. A matriarca se encantou quando descobriu que a origem das cobras era indígena, diretamente de Roraima:
— É fantástica. Sou descendente de índia e, então, foi por isso que gostei. Tudo que é indígena me chama a atenção, mexe comigo.
Segundo o diretor-geral do Porto Alegre em Cena, Fernando Zugno, a obra Entidades representa “um novo momento” na programação do festival.
— Interessa muito para a gente, neste momento, poder pensar outras formas de ocupar a cidade, uma vez que ainda estamos vivendo uma pandemia e temos a preocupação de não aglomerar. E a maneira que a gente queria ocupar a cidade era com obras grandiosas, de trabalhos que esteticamente fossem potentes, que enchessem os olhos e que não passassem batidas — explica Zugno, reforçando que as cobras, para os povos originários, são protetoras da floresta e representam a fertilidade.
O diretor-geral do evento, inclusive, ressalta que colocar a instalação na Redenção faz um contraponto com o Monumento ao Expedicionário.
— Temos um monumento que é símbolo de guerra e, no outro ponto, durante o Porto Alegre em Cena, pelo menos, um monumento que é símbolo de fertilização, de proteção da floresta, da vida, dos conhecimentos e dos povos da floresta e da natureza — enfatiza.