A bombacha do Laçador foi "rasgada", mas não de forma acidental. Ocupando boa parte da largura do monumento — suficiente para um adulto "vestir-se de Laçador" —, a abertura na vestimenta de bronze é uma das formas de acesso ao interior da estátua durante o restauro que é realizado desde o último 28 de setembro. Na manhã de quarta-feira (13), a reportagem de GZH acompanhou o trabalho nesta que é considerada, por boa parte da população, a mais afetiva imagem do gaúcho.
— Não tem dúvida, é a que as pessoas têm mais afeto, como se fosse um familiar, um amigo. Elas nos pedem "toma cuidado", "não vai quebrar" — relata a arquiteta Verônica Di Benedetti, 50 anos, responsável pela revitalização.
A intervenção ocorre em um galpão muito próximo do Sítio do Laçador, na zona norte de Porto Alegre. As janelas, como são chamadas as aberturas, foram feitas na escultura para remover o concreto que servia de contrapeso. O cimento ficava nas pernas do Laçador, mas com o tempo teve um efeito contrário: ao invés de proteger, estava danificando a construção, devido a umidade absorvida pelo material.
Em duas semanas, o concreto foi totalmente removido, o que pode ser observado a partir dos pés do monumento: o interior está oco e, através da base, ganhará uma "estrutura óssea", como compara o engenheiro Valmir Hanzen, 52 anos, da “B&T Engenharia”, contratada para o restauro.
— É como se fosse um esqueleto o que vamos colocar, de aço inox, dos pés até o peito. Assim, quando a estrutura se movimentar (pelo vento e trepidação do piso), toda ela se move igual, evitando rachaduras — detalha o especialista.
Catarinense filho de pais gaúchos, o engenheiro garante que, desde o início, frequentou o galpão onde o Laçador é mantido vestido a rigor:
— Pela tradição, eu uso bombacha sempre.
Outras etapas do restauro
O Laçador está “deitado” sobre uma plataforma. Para romper o antigo preenchimento, foi utilizado um martelete, que quebrou pedra por pedra do material. Há ainda outros “tampões de inspeção”, aberturas que serviram para análises anteriores de sua conservação.
As rupturas na estátua foram identificadas em 2016 e são facilmente vistas quando há luz no seu interior — da distância que o público podia observar, no local de contemplação, não eram perceptíveis. Além disso, há pontos de ferrugem, como na mão direita, onde um laço de ferro era segurado pela figura tradicionalista.
Um microjateamento, com substância de casca de coco, será feito para revelar outros pontos de fissuras e orifícios que precisam ser tapados, em uma espécie de raio X. A aplicação devolverá também os tons verde-escuros originais, na pátina que foi corroída.
Segundo a arquiteta, essa correção das falhas precisa ser tratada com prioridade.
— O Laçador já estava precisando passar por intervenções. É como a saúde da gente, se cuidar dela não precisa passar por uma cirurgia. É para prolongar a vida útil. Se não tomasse as providências de agora, ele teria uma vida mais curta do que terá — explica.
O prazo para restauro é de 90 dias, o que deve ser mantido, segundo as equipes.
Viabilizada pela Lei de Incentivo à Cultura do Rio Grande do Sul, a proposta de restauração faz parte da plataforma Resgate do Patrimônio Histórico, criada pelo Sindicato da Indústria da Construção Civil (Sinduscon-RS). O custo total da obra é de R$ 900 mil, sendo que R$ 810 mil foram captados por meio da legislação criada pelo governo do Estado.
Ouça entrevista de Verônica Di Benedetti e Valmir Hanzen ao programa Gaúcha Hoje, da Rádio Gaúcha.