O público de Porto Alegre, que há cerca de 15 anos não via uma exposição individual de Daniel Senise, terá a oportunidade de conhecer bem a produção do artista carioca, um dos maiores nomes da arte contemporânea no país. Recentemente em cartaz no Instituto Ling, com a mostra Museu, o pintor inaugura uma exposição ainda maior neste sábado. Antes da Palavra leva ao átrio e aos dois andares da Fundação Iberê Camargo 23 trabalhos feitos entre 1993 e 2018.
Ao entrar no edifício, o visitante é recebido por uma instalação suspensa do terceiro andar ao térreo, composta por duas telas medindo cerca 10 metros de altura por 7 metros de largura cada uma. Pequenas manchas dão pistas de que são compostas por lençóis usados. O trabalho começou em 1996, quando a curadora da mostra, Daniela Labra, era assistente de Senise. Os dois contam que doaram lençóis brancos para o Instituto Nacional do Câncer (Inca) e para um motel carioca. Após seis meses, recuperaram as peças, que ficaram guardadas até virarem a primeira versão desse trabalho, intitulado 2.892 e exposto na Casa França-Brasil, no centro do Rio, em 2011. A versão atual se chama 1.587, aludindo ao número aproximado de pessoas que deitaram nos lençóis, bem como os sofrimentos e prazeres vividos ali. Diante da obra, o autor comenta:
– Costumo dizer que o meu problema é com o branco, o que vem depois é responsabilidade do leitor. Neste caso, são brancos iguais, lençóis feitos do mesmo material, mas usados de formas diferentes, mas não opostas. É isso que cria a expansão da leitura desse branco.
Junto à obra, a curadora instalou também trabalhos sonoros de seis artistas. Para Daniela, as pessoas que usaram os lençóis são como "presenças ausentes". As marcas deixadas para trás, que resistiram a repetidas lavagens, são seus vestígios. O procedimento de Senise nas obras expostas no segundo e no terceiro andares da fundação não é tão diferente. Grandes telas exibem resquícios de diferentes lugares e tempos, como a marca circular deixada por um objeto de ferro que oxidou.
O ateliê de Senise é uma referência frequente: o artista usa tecidos para tirar impressões do chão e montar trabalhos cheios de textura. São "tecidos sujos", como o da instalação 1.587.
Quase Aqui, por exemplo, é a mesa de madeira que Senise usava em seu ateliê, exposta como um quadro na parede. Na superfície, é possível distinguir as marcas de anos de trabalho.
– É registro do trabalho. Essas linhas resultam das facas usadas para cortar tiras de tecido. Em algum lugar aí dá para ver até o telefone do meu dentista – brinca Senise.
Ainda que o artista não utilize pincéis, ele se considera um pintor. Daniela refere-se às obras como "pós-pintura":
– O Daniel inventa o seu próprio processo, que envolve colagem, justaposição e reúso de materiais.
Ao final da exposição, o visitante talvez se sinta dentro de um quadro de Senise. É que uma das obras da nova série Biógrafo _ exibidas pela primeira vez _ retrata justamente o espaço da Fundação Iberê.
Antes da Palavra
- De Daniel Senise
- Curadoria: Daniela Labra
- Abertura neste sábado, às 14h, seguida de conversa com o artista e a curadora, às 16h (50 vagas, por ordem de chegada, no átrio).
- No domingo, às 16h, projeção do documentário Daniel Senise: A Construção da Ausência.
- Átrio e 2º e 3º andares da Fundação Iberê Camargo (Av. Padre Cacique, 2.000)
- Visitação: de quarta a domingo, das 14h às 19h, até 29 de setembro.
- Entrada franca.
Outras atrações deste final de semana na FIC
- Sábado e domingo: das 14h às 19h, visitação às exposições #Selfie: Iberê em Modo Retrato (até 25/8), com obras de Iberê Camargo, e Antes da Palavra (até 29/9).
- Sábado: às 16h, bate-papo com o artista carioca Daniel Senise e a curadora Daniela Labra sobre a nova exposição; às 17h, Oficina de Literatura de Cordel em Imagens com inscrições via bit.ly/ibere-cordel.
- Domingo: às 15h, oficina infantil de Kalimba com inscrições via bit.ly/ibere-kal; às 16h, o Cine Iberê apresenta o documentário de Cacá Vicalvi Daniel Senise: A Construção da Ausência.
Próximas exposições na FIC
- A Zona: a Vida e a Morte, de Wesley Duke Lee – De 31/8 a 27 /10.
- Bienal de São Paulo (recorte da última edição do evento) – De 12/10 a 24/11.
- Território Oscilante, de José Bechara – De 12/10 a 15/12.
- Grupo de Bagé – A partir de 30 /11 (sem data de término).