Há um entendimento de que um bom trabalho artístico fala por si, sem a necessidade de que se explique o contexto de sua criação, o processo do qual resulta ou a intenção do artista. Trata-se de encarar a arte como capaz de oferecer ao público uma experiência própria e particular. Ocorre que obras costumam ser vistas em exposições, onde são apresentadas, quase sempre, conforme certa leitura e concepção. É por isso que uma mostra pode tanto potencializar quanto enfraquecer uma obra, seja ela exibida individualmente ou junto a outras.
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Em Local Extremo, no Espaço Cultural da ESPM-Sul, Hélio Fervenza e Maria Ivone dos Santos encaram o ambiente expositivo como o espaço onde suas obras se efetivam. Não que os artistas proponham trabalhos que demandem a participação do público. Suas obras, na verdade, apelam ao olhar e seus possíveis significados se dão pela maneira como estão dispostas conceitualmente e pelas interpretações que esses arranjos instigam. Por isso, na mostra o observador é convidado a apreciar os trabalhos como um arranjo orquestrado pelos artistas. Ou melhor, como uma espécie de partitura, dado o ritmo conferido pelas justaposições das peças e pela forma como exploram noções de espaço, desde as paredes até a própria sala de exposição.
Daí o que torna preciosa essa mostra, que tem visitação aberta até quarta-feira. Nesta segunda-feira, às 10h, haverá um encontro com os artistas mediado pelo crítico, historiador da arte e professor da UFRGS Eduardo Veras e pelo artista e professor da ESPM Richard John, também coordenador do Espaço Cultural.
Artistas, pesquisadores e professores do Instituto de Artes da UFRGS, Hélio e Maria Ivone confluem suas produções individuais em Local Extremo desenvolvendo uma reflexão comum a ambos sobre os modos de apresentação dos trabalhos artísticos e a relação destes com o espaço expositivo. Ou seja: na mostra, suas obras se completam (se isso é possível dizer) na configuração do ambiente e na experiência presencial do público.
Nas paredes, estão lá, primeiramente, os grandes colchetes aplicados em adesivo recortado com os quais Hélio já estabeleceu uma marca registrada, especialmente depois de suas participações na Bienal de São Paulo, em 2012, e na Bienal de Veneza, em 2013. Esses sinais gráficos geram espaços dentro de espaços. São elementos da linguagem escrita que, ao serem propostos como elementos artísticos, transformam-se em signos visuais, interferindo no espaço expositivo e na percepção do observador. É um procedimento conceitual que perpassa toda a mostra.
Nas composições com fotografias e outros trabalhos da dupla, os sinais gráficos sugerem sentenças algébricas que convidam o olhar a equacionar os elementos. Tal proposição se repete nos outros espaços da sala de exposição, mas de modos diversos. Assim como algo que percorre os trabalhos expostos de Hélio e Maria Ivone: processos de reflexão e criação alimentados por olhares investigativos sobre as transformações arquitetônicas, urbanas e geográficas.
Tal interesse dos artistas é estimulado pelo entorno dos lugares nos quais vivem e transitam, especialmente o bairro Petrópolis, em Porto Alegre. Nesse sentido, é como se identificassem na normalidade do cotidiano a existência de uma beleza visual não imediata, que é capturada por eles em trabalhos que, na maneira como são expostos, projetam espaços a serem habitados pelo pensamento.
LOCAL EXTREMO
Espaço Cultural da ESPM-Sul (Rua Guilherme Shell, 268), em Porto Alegre.
Visitação até quarta-feira, das 9h às 22h. Entrada franca.
A exposição: Hélio Fervenza e Maria Ivone dos Santos reúnem trabalhos individuais, propondo diálogos que enfatizam a apresentação das obras e sua relação com o espaço expositivo.