Especialistas alertam sobre os riscos do uso de telas e plataformas digitais por crianças e adolescentes há alguns anos. Ao mesmo tempo, estudos mostram um aumento dessa exposição. A situação impõe um dilema aos adultos: como controlar o acesso e garantir a segurança dos filhos no ambiente digital?
Dados divulgados recentemente pela pesquisa TIC Kids Online Brasil 2024, elaborada pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), apontam que 93% da população brasileira de nove a 17 anos é usuária de internet. O estudo também mostra que 83% possuem perfil em plataformas digitais como WhatsApp, Instagram, TikTok e YouTube e que 29% desses usuários afirmam já ter passado por situações ofensivas.
Com isso, além de estabelecer regras e restrições, é recomendado monitorar as atividades e conversar com esse público sobre os perigos online. Estes são alguns dos objetivos do projeto Conectados e Protegidos, criado neste ano por duas mães, a jornalista Sabrina Passos e a pediatra Carolinne Santin Dal Ri, que se propõe a refletir e conscientizar os adultos sobre o uso saudável das telas e das redes sociais pelo jovens.
Em suas palestras, Sabrina e Carolinne apresentam dados relativos à presença de crianças e adolescentes na internet e dão dicas para os pais e responsáveis lidarem com as situações relacionadas ao universo digital. Conforme a jornalista, a ideia de iniciar o projeto surgiu a partir de notícias sobre o compartilhamento de fotos e vídeos de nudez produzidos com inteligência artificial (IA) envolvendo adolescentes de uma escola de Porto Alegre.
— Era para ser uma conversa de duas mães sobre como conseguiríamos preservar as nossas filhas dos potenciais perigos das redes, das telas, da exposição e do acesso à internet. Mas percebemos que esse é um processo que precisa da comunidade toda, de nós e de outras mães. Então, com o material que tínhamos, fomos convidadas para começar as palestras e alertar os pais — explica Sabrina.
Carolinne destaca o conceito dos mil dias, período que se estende da gestação aos dois anos de idade. A ideia evidencia a importância do início da vida, enfatizando que as experiências dessa etapa são fundamentais para a aprendizagem e o amadurecimento — isso graças à plasticidade cerebral, muito presente em crianças dessa faixa etária:
— É a capacidade do cérebro de modificar suas estruturas em função de respostas às experiências vividas. Sempre brinco que é como se estivéssemos montando a placa mãe de um computador. Acho que esse conceito dos mil dias é fundamental para entender o porquê de não fazer as crianças submergirem nesse mundo das telas tão precocemente.
A pediatra ressalta que vários estudos mostram que essa exposição gera alterações de estruturas cerebrais em uma área que é responsável pelas funções executivas de atenção, controle, planejamento, regulação de emoções, motivação e comportamento emocional. Também é a área onde fica o sistema de recompensa, que envolve o ciclo de dopamina e é uma base para transtornos de dependência.
— O prazer e o sofrimento andam bem coladinhos e buscam bastante equilíbrio. Quando vemos uma criança que fica muito na tela e, se tira a tela dela, o que acontece é que ela fica muito irritada, agressiva, impulsiva — salienta Carolinne, acrescentando que também há impactos negativos no sono e na saúde física, já que há uma “epidemia de inatividade”, conforme a Academia Americana de Pediatria.
Diminuição no uso de telas
Sabrina e Carolinne enfatizam que o objetivo do projeto não é se posicionar contra a internet ou as redes sociais, mas sim oferecer mecanismos para que os pais consigam garantir uma presença digital mais segura e um uso saudável desses dispositivos. Entre as orientações, estão tópicos como o estabelecimento de idade mínima para o uso das redes, conversas sobre comportamento seguro e respeitoso, consentimento e informações privadas.
— Também sugerimos supervisão ativa dos pais e que eles conheçam as ferramentas de controle parental que existem, porque os aplicativos estão aí para serem usados. Mas não somos extremistas, nós contamos nossas experiências — relata a jornalista, afirmando que decidiu tirar as telas da filha de quatro anos após ser alertada por uma oftalmologista e perceber uma mudança de comportamento na criança.
Proteção online
Conforme a TIC Kids, mais de 70% dos responsáveis afirmam que sempre ou quase sempre ensinam os filhos sobre como deve ser a relação com outras pessoas na internet e formas de utilizá-la com segurança. A maioria também garante que conversa com as crianças e adolescentes sobre o que fazem na internet. Já 61% olham o celular para ver o que os filhos estão fazendo ou com quem estão falando.
Os aplicativos indicados pelas mães para controle parental são o Family Link (Android) e o Family Sharing (iOS):
- Family Link: pode ser usado para criar uma conta do Google para uma criança menor de 13 anos ou para ativar a supervisão da conta já existente. É possível monitorar tempo de uso, localização e gerenciar a privacidade. Também pode ser usado para supervisionar adolescentes.
- Family Sharing: pode ser usado para configurar um novo iPhone ou iPad para uma criança ou adolescente e personalizar os controles parentais. É possível ativar restrições de privacidade para gerenciar conteúdo, aplicativos e ajustes no dispositivo. Também permite restringir conteúdo explícito, compras, downloads e com quem a criança pode se comunicar, além de criar limites de repouso.
Dicas para navegação online saudável
Estabeleça uma idade mínima para uso das redes sociais: muitas plataformas têm políticas que exigem que os usuários tenham pelo menos 13 anos de idade. Respeite essas diretrizes e adie a introdução das crianças às redes até que sejam maduras o suficiente para entender os riscos envolvidos.
Converse sobre comportamento online seguro e respeitoso: discuta sobre como se relacionar de forma segura e respeitosa nas redes sociais. Isso inclui não compartilhar fotos ou mensagens que possam ser consideradas inadequadas ou ofensivas e não se envolver em cyberbullying ou assédio online.
Mantenha linhas de comunicação abertas: estabeleça uma comunicação aberta com seus filhos para que se sintam à vontade para relatar qualquer atividade suspeita ou preocupante que encontrem online. Esteja disponível para responder a perguntas ou preocupações que possam surgir.
Ensine sobre a importância do consentimento: ajude seus filhos a entender que eles têm o direito de definir limites e aceitar ou não interações online, incluindo solicitações de amizade, compartilhamento de fotos ou participação em conversas de grupo.
Ensine sobre compartilhamento seguro de informações: explique a importância de não compartilhar informações pessoais, como endereço, número de telefone ou localização, em suas postagens ou conversas online. Ensine a identificar e evitar golpes, como proteger suas informações pessoais e lidar com o cyberbullying e o assédio online. Reforce a importância de usar senhas fortes e de ter cuidado antes de clicar em links ou fazer download de arquivos.
Monitore as atividades online (supervisão ativa): faça um esforço para monitorar as atividades online regularmente, seja verificando suas postagens e interações nas redes sociais ou usando ferramentas de controle parental. Isso pode envolver estar presente durante o tempo de navegação na internet, limitar o tempo online e conversar regularmente sobre segurança no ambiente digital.
Conheça as plataformas: familiarize-se com as redes sociais que seus filhos usam. Entenda como funcionam, quais são suas políticas de privacidade e segurança, e quais ferramentas de controle parental estão disponíveis. Muitos dispositivos e serviços online oferecem opções de controle que permitem aos pais restringir o acesso a determinados sites, controlar o tempo gasto online e bloquear conteúdo inadequado.
Ative as configurações de privacidade: ajude seus filhos a configurar suas contas de redes sociais com as configurações de privacidade mais restritivas possíveis. Isso pode incluir tornar seus perfis privados, restringir quem pode enviar solicitações de amizade ou mensagens e controlar quem pode ver suas postagens.
Fontes: Sabrina Passos e Carolinne Santin Dal Ri, criadoras do projeto Conectados e Protegidos