A dona de casa rio-grandina Maria Cristina Tavares de Oliveira Borges, 65 anos, aguarda há mais de seis meses alguma movimentação no pedido que fez de pensão pela morte do marido, Carlos Rocha Borges, 70 anos, por covid-19. A vida se tornou uma sucessão de agruras, inclusive financeiras, após a doença que o matou, em 27 de setembro de 2020. Outra história que ilustra o empobrecimento das famílias com as perdas de entes queridos para o coronavírus.
“Mergulhão”, apelido dos litorâneos, de Santa Vitória do Palmar, Carlos construiu a vida em Rio Grande, cidade onde foi morar aos 12 anos. Motorista do Ministério dos Transportes, aposentado, adorava viagens e futebol: era torcedor fiel do São Paulo rio-grandino.
O motorista e sua esposa, Maria Cristina, foram hospitalizados juntos por causa da covid-19. Os dois ficaram na UTI. Ela respondeu bem à manobra de prona (ação de acomodar o paciente de barriga para baixo para melhorar a oxigenação dos tecidos e a respiração) e não precisou ser entubada. Carlos não teve o mesmo destino e seguiu em coma induzido.
Maria Cristina saiu do hospital numa sexta-feira e o marido morreu dois dias depois. Além do baque emocional, teve várias sequelas físicas. Até para vestir roupa precisava de ajuda, descreve uma das filhas de Carlos Borges, a geógrafa e funcionária pública Carolina.
— Afora tudo isso, tivemos de ver a papelada. Ainda bem que o pai tinha um dinheiro reservado, o pai era muito organizado. Mas o maior problema é que a pensão pós-morte dele, de funcionário público, não saiu ainda. Toda a movimentação burocrática é bem complicada, via internet. Está tudo atrasado — relata Carolina.
Carlos era o principal sustentáculo da família. Maria Cristina teve a renda cortada a quase zero. Recebe uma aposentadoria de um salário mínimo. Todos os vencimentos que o marido recebia deixaram de existir com a morte dele. O cálculo é que a pensão, quando vier, fique entre R$ 4 mil ou R$ 5 mil. Um futuro ainda distante e incerto.
Contribuição
Um dos filhos, militar do Exército aposentado por invalidez, é quem ajuda a mãe. Não só financeiramente, mas para tudo: compras, transporte e questões de saúde.
— As sequelas emocionais e físicas ainda são muito fortes. E as condições financeiras mudaram absurdamente. Casa e carro estão inegociáveis, já que precisa fazer inventário. A mãe não consegue acessar a pensão e nem tem direito de vender qualquer um desses bens. O financiamento do automóvel ficou a cargo do meu irmão — pontua Carolina.
INSS
Foi por sua família ter enfrentado na carne as consequências da pandemia que Carolina se juntou à Associação de Vítimas da Covid (Avico). A entidade busca confortar doentes atingidos pelo coronavírus e seus familiares.
Sobre o atraso na concessões de pensões, após um ano de pandemia, o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) fechou 2020 com quase 1,7 milhão de pedidos à espera de resposta do órgão, responsável pelos benefícios da Previdência Social.
O gerente executivo do INSS no RS, Claiton Soares, informa que uma força-tarefa tenta atualizar as pensões no Estado, providenciando os benefícios dentro dos 45 dias úteis que estão previstos em portaria. Em nível nacional, confirma que há, atualmente, cerca de 2 milhões de benefícios em espera de análise, sendo que esta quantidade inclui todo tipo de benefício, não apenas pensões. Para o Rio Grande do Sul, não há número estimado de pedidos em atraso.