Não existe regra. Na hora de assumir ou romper um relacionamento amoroso não é possível preestabelecer uma melhor época do ano para fazê-lo. No entanto, dados do Colégio Notarial do Brasil – Seção Rio Grande do Sul (CNB/RS) sinalizam algo que pode ser uma tendência entre os moradores do Rio Grande do Sul: a de assinar o divórcio no fim do ano.
Conforme o levantamento da CNB/RS, de 2015 a 2018, os últimos trimestres foram os que mais registraram dissoluções matrimoniais no Estado. O pico ocorreu no ano passado, quando os tabelionatos de notas tiveram 1.929 divórcios entre outubro e dezembro. Nos anos anteriores, o índice foi de aproximadamente 1,7 mil divórcios/ano nos últimos trimestres.
Nos Estados Unidos, uma pesquisa tentou investigar a relação entre dados e datas, no entanto, os resultados obtidos não passam de hipóteses. Publicado em 2016, o levantamento feito pela University of Washington ao longo de mais de uma década mostrou que a tendência era um maior número de divórcios em março e em agosto, períodos pós inverno e férias de verão no país. Julie Brines, professora de sociologia que conduziu a pesquisa, sugeriu, à época, que esses picos fossem resultado tanto da frustração com as férias quanto do ajuste financeiro familiar para arcar com os custos da separação, o que ocorreria mais em março.
— O divórcio é multifatorial, pois há uma série de questões relacionadas à conjugalidade. Por isso fica complicado especular qual é a razão máxima que faça eles se divorciarem em determinado período — avalia o psicólogo especialista em terapia de casal e família Gustavo Affonso Gomes, professor de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS).
Da mesma forma que os dados norte-americanos apontam suposições, os índices daqui também não têm uma razão muito clara. Uma ideia aventada pela doutora em psicologia pela Universidad Autónoma de Madrid Adriana Wagner é de que as pessoas se valem de demarcadores para resolver algumas questões, e o fim de ano pode ser um deles. É como se o prazo limite para solucionar algo cessasse até a virada do calendário.
— Mas é preciso lembrar que os casais se separam muito antes da assinatura do divórcio. Os números que temos são apenas dos registros civis. Nesses casos, os processos emocionais que envolvem um divórcio podem durar muitos anos — pondera Adriana, que também coordena o Grupo de Pesquisa de Dinâmica das Relações Familiares da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), que completa 25 anos neste ano.
Embora não seja possível comprovar, ainda há a hipótese de que a proximidade com o verão mobilize mais as pessoas. Como a estação tende a trazer mais vivacidade, é possível que muitos aproveitem essas datas próximas para colocar fim em um ciclo.
— Vemos muitos namoros acabando nesse período ou pessoas que não querem assumir nada nessa época em função do verão. Há quem se envolva e ao mesmo tempo se freia em função do verão — ilustra a psicóloga Andréa Alves.
Aqui, apesar de os números indicarem essa propensão, não é possível cravar que todo o processo inicie e termine dentro desses três meses. Isso porque para concluir o divórcio, é preciso que as duas partes estejam de acordo e assinem o documento, o que muitas vezes se arrasta por anos.
Na tabela a seguir, é possível conferir o total de registros de casamentos e de divórcios no último trimestre dos anos de 2015 a 2018, no Rio Grande do Sul. Os dados são do Colégio Notarial do Brasil – Seção Rio Grande do Sul (CNB/RS) e da Central Nacional de Informações do Registro Civil - CRC Nacional:
O divórcio
Logo no dia seguinte ao Natal de 1977, o Brasil ingressou em um novo momento social de sua história. Naquela data, a lei do divórcio (Lei 6.515/1977) foi sancionada. Desse movimento inicial até agora, bastante coisa mudou. Uma delas foi a possibilidade de fazer todo o processo em um tabelionato, garantida pela Lei 11.441/2007.
Mais rápido, fácil e barato, o divórcio extrajudicial contabiliza, de 2007 até hoje, cerca de 650 mil processos em todo o país, destaca Ney Paulo Silveira de Azambuja, presidente do CNB/RS.
— Se em 2007 tivemos 19,7 mil divórcios extrajudiciais no Estado, em 2018, chegamos a 70 mil. No início, pelo desconhecimento ou falta de hábito dos advogados, houve uma certa resistência. A partir do momento em que perceberam que um processo no Judiciário levava cerca de seis meses a um ano e no tabelionato isso poderia ser feito em um dia, aumentou a procura pelo divórcio extrajudicial.
Para fazer o divórcio extrajudicial, é necessário que haja consenso entre as partes, ausência de filhos menores e/ou incapazes e pelo menos um advogado para o casal.
A decisão
Dificuldade em resolver os conflitos cotidianos e as crises evolutivas vitais são apontados por Adriana como fatores que impulsionam o afastamento entre casais. Dessa forma, a separação aparece como uma alternativa para solucionar conflitos que se somam na conta da relação conjugal.
— Divórcio era o fim da linha para um casal no passado. Hoje, ele é uma das estratégias para resolver conflitos. Quando as pessoas envolvidas se sentem despreparadas para enfrentar conflitos íntimos, muitas vezes, decidem pela separação, pois não é mais um tabu ser divorciado. Estamos trabalhando um conceito novo para ajudar os casais a enfrentar de forma mais saudável essas questões que é a educação para a conjugalidade. Os casais podem aprender a lidar melhor com suas diferenças e necessidades. A ideia é de ampliar o leque de possibilidades de como encaminhar os conflitos antes que a desavença se transforme num sintoma — diz a pesquisadora da UFRGS, que promove intervenções psicoeducativas com grupos de casais sobre o “viver-a-dois”.
Gomes, por sua vez, aposta na comunicação para buscar resolver os problemas e acertar os ponteiros. Segundo ele, os casais andam menos tolerantes e mais apegados aos defeitos do outro.
— Eles têm olhado pouco para as diferenças enquanto diferenças, mas sim como defeitos. Isso acaba dificultando a comunicação. Um aponta o dedo para o outro e não olha para si.
Se a discussão entre os envolvidos não for possível, a recomendação é buscar ajuda profissional e investir em uma terapia de casal.