Alguns anos atrás, Patrick Roche estava trabalhando para um escritório de arquitetura na cidade de Nova York e, em paralelo, administrava um negócio de futebol de bolha, um jogo em que os participantes ficam com a metade de cima do corpo dentro de uma bolha gigante e vão de encontro uns contra os outros, como ele explicou. Era divertido, mas o trabalho principal era estressante e exaustivo. Ele não estava dormindo bem. Roche queria deixar a arquitetura, mas futebol de bolha, ele pensou, talvez não tivesse um futuro muito promissor. Ele tinha lido livros de empreendedorismo e todos diziam a mesma coisa: simplesmente abra um negócio.
Enquanto isso, estava experimentando diferentes soluções para a insônia: meditação, diminuição da cafeína, exercícios. A de que mais gostou foi um cobertor pesado – essencialmente, um edredom muito, muito pesado, preenchido com vidro ou contas de plástico, até então mais comumente usado para acalmar crianças autistas e pessoas com transtornos de processamento sensorial. Será que vendê-los poderia ser o início de um empreendimento?
Passou, então, a comercializar uma versão genérica no site chinês Alibaba e personalizou-a para compradores com perfis de design avançado, envolvendo o produto em uma capa de algodão cinza. Roche batizou a criação e a nova empresa de Rocabi (pronuncia-se “rock-a-bye”). Em junho de 2017, ele tinha presença digital, alguns anúncios básicos no Google e espaço na Amazon. Em 2018, a Rocabi estava vendendo milhares de unidades por US$ 199 e lançou um novo produto logo antes do Natal: o Boyfriend Blanket, feito de lã de ovelha e brim, para imitar a aparência de uma jaqueta jeans aconchegante.
O quarto como ambiente de cura
Roche, 32 anos, não está sozinho no comércio de roupas de cama pesadas, já que ele e outros novos fabricantes de colchas terapêuticas esperam transformar o quarto em um ambiente de cura, o estágio mais avançado da mercantilização do sono. Roupas de cama pesadas e outros itens de compressão ressoaram, metafórica e fisiologicamente, como objetos transacionais para uma população em constante estresse.
Quase ao mesmo tempo que Roche estava tendo sua ideia, Kathrin Hamm, economista alemã, estava trabalhando no Banco Mundial, em Dubai, cobrindo o Oriente Médio e viajando para diversos lugares com distintos fusos horários. Assim como Roche, tinha dificuldade para dormir e, por isso, experimentou um cobertor pesado, o que também despertou o lado empreendedor dela. Será que poderia transformá-lo em uma peça mais atraente e menos quente? Ela levantou quase US$ 250 mil no Kickstarter (maior site de financiamento coletivo do mundo) e começou a vender o Sleeper, edredom de um branco revigorante feito de eucalipto e recheado de areia, por US$ 199. O sucesso de vendas foi tamanho que ela decidiu deixar o emprego. Os amigos achavam que estava ficando louca.
— Sou de uma pequena cidade da Alemanha. Eles sabiam que eu era uma economista que trabalhava para o Banco Mundial. E agora estou tentando vender cobertores na internet. Para eles, alguma coisa deve estar errada — contou Hamm, 36 anos.
A maioria dos novos empreendedores do setor espera bater o sucesso da Gravity Blanket, cuja própria campanha no Kickstarter angariou mais de US$ 4,7 milhões há alguns anos. No fim de 2018, as vendas dessa coberta de pelúcia atingiram US$ 18 milhões e a revista Time classificou o produto como uma das melhores invenções do ano.
Com uma capa de material que imita plush e lembra os cobertores de avião, o Gravity Blanket estava pedindo por um pouco de concorrência. No fim do ano passado, a Holden & Hay, uma empresa do Colorado que vende roupa de cama de lã para bebês e cachorros, lançou uma campanha na Kickstarter para produzir cobertores de peso “ecologicamente corretos” estampados com motivos nativos americanos e preenchidos com “jeans de mamãe”. E Hamm, cuja empresa foi batizada de Bearaby – um neologismo que evoca um abraço de urso (bear) e uma canção de ninar (lullaby) –, vende agora também o Napper, manta de tricô de nove quilos disponível em seis cores (US$ 249).
Imobilizados, mas com sono profundo
Há também o Sleep Pod, um casulo cinza de fibra elástica (US$ 110). O inventor, Matt Mundt, 28 anos, é formado em engenharia mecânica e já desenvolveu produtos para a Apple. Com dificuldade para dormir, ao estudar o universo do sono percebeu que estava saturado de cobertores de peso. Foi impelido a inovar.
— Tenho quase dois metros de altura e não conseguia suportá-los. Morria de calor, meus braços e pernas ficavam para fora, o cobertor caía da cama, era simplesmente uma bagunça. Tenho cinco patentes. Sabia que seria capaz de produzir algo melhor — explicou Mundt.
A solução que encontrou foi fazer uma cápsula de 227 gramas de um tecido elástico que imita, segundo ele, a pressão do cobertor de peso, mas sem o lastro, que tipicamente representa 10% do peso do corpo do indivíduo (a maioria das empresas oferece três opções: sete, nove e 11 quilos). Além disso, resolve o problema do cônjuge: cada um pode dormir no próprio casulo, como Mundt e a esposa, Angie, fazem.
O Sleep Pod não fez sucesso na minha casa: “Tire isso agora!”, ordenou minha companheira de quarto, em pânico, chutando o objeto freneticamente. Eu o achei perfeitamente aconchegante, porém não particularmente apertado. Ele serviu aos meus objetivos de sono, mas, talvez, não seja terapêutico do ponto de vista da pressão. E a pressão intensa é o principal fator em um cobertor de peso, pois ela eleva os níveis de serotonina e melatonina, que, em troca, reduzem a ansiedade, dizem os fabricantes, citando vários estudos.
Quando era criança, Temple Grandin – professora autista de ciência animal que ficou famosa quando Oliver Sacks divulgou suas inovações para redução do estresse em animais domésticos – gostava de ficar debaixo das almofadas do sofá e pedia que a irmã se deitasse por cima. Ela detestava o toque humano, mas a sensação de ser esmagada sob travesseiros a relaxava. Aos 18, construiu sua primeira “máquina do abraço”, um grande aparato estreito e firme feito de madeira compensada, espuma e um pouco de pele sintética, que ela usava para sufocar a própria ansiedade e se acostumar com o toque de outras criaturas. Grandin observa em seu site que, depois de um tempo, o gato não fugia mais dela. “Eu tinha de estar confortável primeiro, antes de oferecer conforto ao gato”, escreve a americana de 71 anos, retratada no premiado telefilme Temple Grandin (2010), em que foi interpretada pela atriz Claire Danes.
Em uma tarde gelada em que havia um ciclone na cidade, estiquei o Boyfriend Blawnket no sofá com o lado peludo para cima. Deitei-me sobre ele com meu gato e puxei com força o Napper sobre os tornozelos. (Hamm, que trabalhou com um cientista do sono durante o processo de criação, disse que a sugestão é colocar a coberta primeiro na altura dos joelhos para se acostumar com o peso.) Apesar de imobilizados, o gato e eu dormimos profundamente.
Por Penelope Green