Não há muitas dúvidas de que o Flamengo, com todo seu poder econômico e profissionais qualificados, providenciou praticamente tudo o que exigem os protocolos de saúde para atividades em tempos de coronavírus. O que o clube de maior torcida do Brasil ignorou, ao retomar por conta própria suas atividades, é que as autoridades do Rio de Janeiro não as autorizavam. Não acatar leis ou o que mandam os governantes é, no mínimo, um péssimo exemplo e pode perfeitamente ser colocado como desobediência civil.
Os grandes clubes de futebol no Brasil se acostumaram ao longo do tempo a ter costas quentes e muita influência política. Quantas vezes já houve renegociações de dívidas fiscais, cessão de áreas públicas, facilitação em financiamentos ou a não execução de ações judiciais? Resultado: muitos dirigentes se acham acima das leis e dos governos, respaldados por terem sob suas bandeiras milhões de apaixonados torcedores. Assim está acontecendo no Ninho do Urubu, o mesmo local em que houve um incêndio que vitimou jovens atletas e cujas instalações contrariavam as exigências oficiais de segurança. Governador e prefeito do Rio de Janeiro negam aprovação para a volta aos treinos dos clubes de futebol, mas a diretoria rubro-negra prefere ignorar. Lá estão os campeões da América treinando, depois dos primeiros exames do clube apontarem que mais de 30 pessoas entre funcionários e atletas tinham resultado positivo para coronavírus.
Por mais que haja contrariedade política ou de postura contra Wilson Witzel ou Marcelo Crivella, não se pode ignorar suas determinações. Se o Flamengo pode, por que outros clubes ou simples cidadãos não podem fazer o que querem? Paralelo ao pouco caso diante das autoridades locais do Rio, o presidente do clube vai a Brasília pedir auxílio de Jair Bolsonaro. Possivelmente se o Presidente da República dissesse algo contrário às intenções de Rodolfo Landim, também seria ignorado ou desautorizado e teria que conviver com um novo slogan: "Flamengo acima de todos".
O mais prudente para o bicampeão da América seria usar o exemplo de outros dois bicampeões que, em Porto Alegre, se prepararam tão bem quanto o Flamengo, mas que esperaram liberações da Prefeitura de Porto Alegre e do Governo do Estado do Rio Grande do Sul para voltarem aos treinos.