Vários nomes foram cogitados publicamente. "Eu sempre fui a primeira opção", revelou Hamilton Mourão em uma entrevista dia 7 de setembro, enquanto o Brasil celebrava os 196 anos da Independência. O general foi escolhido para ser o vice de Jair Bolsonaro por sua liderança no Exército e pelas opiniões fortes sobre a esquerda, quase todas contrárias.
Vencida a eleição, chegou a hora da engenharia. Nem combate à violência, nem à corrupção, nem tripudiar a esquerda. Nada disso daí. Bolsonaro só começará o seu governo depois de acomodar as forças que o apoiaram. Mourão, 65 anos, gaúcho de Porto Alegre, é uma delas.
De acordo com a Constituição, a única obrigação do vice é estar preparado para assumir a Presidência em caso de necessidade. De certa forma, já aconteceu quando Bolsonaro foi vítima de uma facada e Mourão se viu alçado ao centro dos holofotes.
Na tradição recente do Brasil, os vices começaram discretos. Nem todos terminaram assim. O general será diferente. Terá voz desde a largada. É o seu estilo, e Bolsonaro sabia antes de fazer o convite.
Durante a campanha, Mourão e Bolsonaro tiveram momentos de descompasso. O primeiro deles motivado pela análise do vice sobre o peso do 13º salário na economia brasileira. Na mesma época, Mourão defendeu uma constituinte formada por "notáveis". Também aventou a possibilidade de um autogolpe em caso de anarquia, com o objetivo de garantir governabilidade. "Ele é general, eu sou capitão. Mas eu sou o presidente. Desautorizei-o nesses dois momentos", disse Bolsonaro, visivelmente irritado, ao Jornal Nacional do dia 8 de outubro. Depois disso, os dois apareceram pouquíssimas vezes juntos na campanha.
Hamilton Mourão ingressou no debate político em 2015. Era desconhecido fora da caserna e estava à frente do Comando Militar do Sul. Durante uma palestra no CPOR, em Porto Alegre, projetou cenários estruturados para o futuro imediato do país. Um deles incluía o impeachment da presidente Dilma Rousseff. A repercussão foi gigantesca. Gerou desconforto nos gabinetes de Brasília, mas consolidou a liderança de Mourão entre os setores que articulavam a queda do PT.
Como punição, pouco tempo depois, o general foi exonerado do Comando Militar do Sul. A concorrida cerimônia de transmissão de cargo, no dia 26 de janeiro de 2016, em Porto Alegre, teve tom político. Lá estavam Mourão, o general Edson Leal Pujol – seu sucessor – e um convidado de honra: o deputado federal Jair Messias Bolsonaro, o mais implacável crítico do PT no Congresso. Mourão foi transferido para a Secretaria de Economia e Finanças do Exército, setor administrativo e distante da tropa, mas não do combate.
Dois anos depois, empurrado pela onda antipetista e pelo isolamento da candidatura de Bolsonaro, que não construiu alianças com grandes partidos, Mourão virou uma peça importante no tabuleiro da nação.
Quando publiquei a notícia sobre a palestra de 2015 no CPOR e as observações sobre um possível impeachment – eu era o único jornalista lá –, houve grande repercussão no centro do país. Virou capa da Folha de S. Paulo, rendeu análises no Congresso, mensagens em grupos de militares no WhatsApp e comentário do Bob Fernandes na TV. Foi o momento em que Mourão começou a ganhar notoriedade pública.
Na época, questionei a mim mesmo se o general, quando disse o que disse em uma palestra pública, tinha noção do tamanho da crise que acabara de provocar. Ouvi a resposta definitiva de um velho amigo, que não é do Exército: "Um homem na posição dele não pode se dar ao luxo de não calcular, antes, as consequências do que diz".
Mourão sabe muito bem a relevância da posição que ocupará a partir de janeiro.