A Sessão da Tarde desta sexta-feira (16), às 15h25min, na RBS TV, exibe Toy Story 4, que está para a Pixar como Vingadores: Ultimato está para a Marvel.
Há diferenças fundamentais, claro, como a duração (Toy Story 4 tem uma hora e 40 minutos, Ultimato, três horas) e a forte presença da morte no filme dos super-heróis. Mas há muito mais semelhanças.
Para começar, ambos os filmes foram lançados coincidentemente no mesmo ano, 2019. E ambos demandam que se saiba bastante sobre seus predecessores e nada sobre a história que será contada. É preciso conhecer os personagens e seu passado, estar envolvido, mas também é preciso evitar qualquer tipo de spoiler, pois as surpresas são gatilhos emocionais (se não cheguei a chorar em Ultimato, faltou mão para secar o rosto no terço final de TS 4).
Toy Story 4 e Vingadores: Ultimato não trazem marcas de suas produtoras: o curta-metragem que antecede o filme, no caso da Pixar, e as cenas pós-créditos, no da Marvel. Neste último, essa ausência sinaliza o luto pelo fim de um ciclo iniciado 11 anos antes, com Homem de Ferro (2008). No primeiro, serve de aviso: este é mesmo um desenho animado diferente. Era chegada a hora de dizer adeus aos queridos personagens que acompanhávamos havia quase 25 anos, desde que Toy Story (1995) nos apresentou ao conflito entre o antiquado Woody, um mero caubói de pano, e o moderno Buzz Lightyear, um astronauta repleto de botões e funções (e que acabou retornando em uma aventura solo em 2022).
Aliás, aí está outra semelhança da tetralogia da Pixar com a franquia da Marvel: de certa forma, os dois brinquedos espelham o Capitão América, um idealista que foi literalmente trazido de um tempo antigo, e o Homem de Ferro, a personificação algo arrogante de avanços tecnológicos.
A Marvel e a Pixar também olharam para onde os ventos sopram. Se a primeira vem dando espaço à diversidade em títulos estrelados pelo Pantera Negra, pela Capitã Marvel e por Shang Chi e arregimentou um batalhão de mulheres para uma cena emblemática da batalha final de Ultimato, Toy Story 4 dá protagonismo às personagens femininas. Os brinquedos que eram de Andy agora estão com a pequena Bonnie. Consequentemente, Woody não tem mais a mesma ascendência: sua estrela de xerife volta e meia vai parar no peito de Jessie, e há uma "prefeita" no armário da guriazinha, a boneca Dolly. A trama foi escrita a partir da pergunta "O que aconteceu com Betty?", o abajur de porcelana visto pela última vez em Toy Story 2 (1999), e que agora encarna a mulher independente e destemida, tendo a seu lado outra garota, Isa Risadinha, um dos tantos alívios cômicos em um filme que aborda temas tão dolorosos como abandono, sentimento de exclusão e depressão. Há até uma vilã, digamos assim, Gabby Gabby, a boneca relegada ao esquecimento e à amargura porque lhe falta voz — extrapolando no simbolismo, é a mulher que sofre calada porque ninguém a escuta.
Os cenários de Toy Story 4 também permitem uma aproximação estética com Ultimato. Se os Vingadores empreendem uma viagem no tempo, em que revisitam momentos marcantes de sua trajetória, Woody e sua turma aventuram-se em lugares que remetem ao passado e à nostalgia: um antiquário e um parque de diversões. Lá, os brinquedos vão revisitar não cenas, mas suas próprias relações e atitudes. O fanfarrão Buzz, por exemplo, vai descobrir sua voz interior — sempre soubemos que por trás da armadura do astronauta e da de Tony Stark havia um enorme coração, né? Um dos personagens novos, o motoqueiro acrobata Duke Caboom, lembra o desacreditado Thor do filme dos Vingadores, sentindo-se indigno do ato de coragem que deve realizar. A dupla estreante Coelhinho e Patinho (no Brasil, muito bem dublados pelos humoristas Marco Luque e Antonio Tabet) encarna o espírito mordaz do guaxinim Rocky — para eles, a solução passa sempre por tocar o terror.
Como em Ultimato, a jornada de Toy Story 4 é cheia de desafios e desencontros e requer muita união e algum sacrifício — em uma mensagem de nobreza e empatia, Woody entrega sua voz para Gabby Gabby ter uma segunda chance. "Os seus problemas são meus também", já diz a letra da clássica canção Amigo Estou Aqui. A exemplo do Homem de Ferro, Buzz Lightyear assume sua condição de líder, e, tal qual no combate contra Thanos, surgem aliados na hora certa para desviar o rumo da história. Se Thor se junta aos Guardiões da Galáxia, acenando para o futuro, Duke Caboom ganha uma nova família, prenunciando novas aventuras.
Mas, como acontece no filme dos Vingadores, um herói da Pixar decide, por conta própria, dar o ponto final em sua história. Depois de atuar com sucesso no amadurecimento de Andy; depois de proteger incansavelmente o brinquedo que Bonnie criara como aliada em sua adaptação à escolinha, Garfinho (o que também constitui uma defesa apaixonada da criatividade e da fantasia); depois de tornar-se o fiel depositário das angústias e das alegrias do público que cresceu acompanhando suas aventuras; depois de possibilitar o reencontro de pais com sua própria infância, o velho Woody, assim como o Capitão América, permitiu-se envelhecer. Assim como o soldado legou o escudo ao Falcão, o xerife passou sua insígnia para Jesse. Assim como Steve Rogers pôde, enfim, dançar de novo com a amada Peggy, Woody agora pode, enfim, dançar com a amada Betty.
Para terminar as comparações, em 2026 teremos os retornos tanto dos super-heróis da Marvel, em Vingadores: Doomsday (que inclusive promoverá a volta do ator Robert Downey Jr., agora como o vilão Doutor Destino), quanto dos brinquedos da Pixar. Em Toy Story 5, Woody, Buzz e sua turma vão tentar impedir que a sua nova criança se renda à tecnologia.