Três cinemas de Porto Alegre exibem o filme que a Argentina escolheu para tentar uma vaga no Oscar internacional: Os Delinquentes (Los Delincuentes, 2023), de Rodrigo Moreno, está em cartaz desde quinta-feira (26) no CineBancários, no Espaço Bourbon Country e na Sala Paulo Amorim.
O país busca sua nona indicação ao prêmio da Academia de Hollywood, que por duas vezes já laureou os argentinos — primeiro por A História Oficial (1985), de Luis Puenzo, depois por O Segredo dos seus Olhos (2009), de Juan José Campanella. Exibido na mostra Um Certo Olhar do Festival de Cannes, Os Delinquentes não tem duas características comuns a títulos que concorreram à estatueta dourada: não aborda a ditadura militar, como A História Oficial, O Segredo dos seus Olhos e Argentina, 1985 (2022), nem traz no elenco Ricardo Darín, presente em O Filho da Noiva (2001), O Segredo dos seus Olhos, em Relatos Selvagens (2014) e em Argentina, 1985.
Este é o sétimo longa-metragem de Rodrigo Moreno, premiado nos festivais de Berlim e de Havana por O Guardião (El Custodio, 2006). O próprio diretor escreveu a trama que se desenrola por longas três horas. Essa duração revela-se inflada e desnecessária, um capricho pretensioso que é preenchido ora com o esticamento de cenas corriqueiras, ora com divagações e reiterações que pouco acrescentam ao desenvolvimento da história ou dos personagens. É uma pena, pois Os Delinquentes tem virtudes que poderiam credenciá-lo a ser um dos melhores filmes do ano.
A primeira hora é envolvente, inclusive por Moreno não ter pressa para retratar o cotidiano de Morán (interpretado por Daniel Elias), empregado que cuida do cofre de um banco em Buenos Aires. Cansado da monotonia e oprimido por constatar que, não raro, vivemos para trabalhar, ele resolve roubar cerca de US$ 600 mil. Morán não pretende gastar muito: só quer ter tempo livre. É "um homem bom, o problema é que está ficando velho", como dizem os versos de sua canção favorita (El Viejo) no disco de estreia da banda argentina de rock Pappo's Blues, lançado em 1971.
Seu planejamento é ao mesmo tempo metódico e surpreendente: Morán sabe que vai acabar sendo preso (foi flagrado pelas câmeras de segurança), então decide tornar cúmplice um colega que, na hora do roubo, precisou se ausentar para uma consulta médica. Trata-se do personagem encarnado por Estebán Bigliardi, Román — repare que o nome é um anagrama de Morán, assim como o de Norma (Margarita Molfino), que surgirá mais adiante, refletindo a liberdade, a sensibilidade e a harmonia com a natureza que faltam a ambos.
O jogo de espelhamentos e interligações conta com outra boa sacada: o mesmo ator, Germán de Silva (o caseiro que, em Relatos Selvagens, uma família rica quer que assuma a culpa por um atropelamento), faz o papel tanto do patrão de Morán e Roman, Del Toro, quanto o de um chefe do crime, Garrincha. É como se um banqueiro e um ladrão fossem "a mesma pessoa", mas essa ideia acaba sendo pouco explorada.
Porém, também é um acerto de Os Delinquentes se concentrar na crise de consciência que atinge Roman a partir do momento em que é convencido (ou coagido) a guardar o dinheiro para Morán — resoluto em cumprir três anos e meio de pena na prisão, que parecem um nada perto dos mais 20 e poucos que eles teriam de trabalhar para ganhar essa grana. Roman só precisa ficar de bico calado enquanto o caso é investigado no banco — o que rende momentos dramáticos e também cômicos. Mas a bolsa lotada de dólares é como um veneno que corrói a alma — e aí Moreno, num aceno à cinefilia, leva seus personagens a assistirem a O Dinheiro (1983), o derradeiro filme do mestre francês Robert Bresson.
O filme argentino começa a tornar-se cansativo e previsível quando Roman conhece Norma. Ainda que pareça um desvio inesperado na trama, pode-se intuir os passos que levarão a outro conflito. Quando esse conflito é por fim explicitado, Os Delinquentes passa a se arrastar por quase mais uma hora até um epílogo que, felizmente, deixa em aberto para o espectador.