Disponível há algumas semanas no Amazon Prime Video, Licorice Pizza (2021) valeu a Paul Thomas Anderson um recorde no Oscar. Entre os concorrentes das principais categorias, o cineasta californiano tornou-se o maior perdedor: já recebeu 11 indicações, mas nunca venceu.
Por Licorice Pizza, Anderson, 52 anos, disputou os prêmios de melhor filme (assina a produção com Sarah Murphy e Adam Somner), direção e roteiro original. Antes, concorrera por Sangue Negro (2008), indicado a melhor filme, direção e roteiro adaptado, por Trama Fantasma (2017), nas categorias de filme e direção, e pelos scripts de Boogie Nights (1997), Magnólia (1999) e Vício Inerente (2014).
Ao passar em branco na última cerimônia da Academia de Hollywood, PTA se distanciou do ator Peter O'Toole (1932-2013), oito vezes indicado ao Oscar entre Lawrence da Arábia (1962) e Vênus (2006), e da atriz Glenn Close, 75 anos, que também concorreu oito vezes, entre O Mundo Segundo Garp (1982) e Era uma Vez um Sonho (2020).
O consolo é que o cineasta já foi premiado nos três principais festivais europeus. Em Cannes, faturou o troféu de diretor por Embriagado de Amor (2002). Em Veneza, o Leão de Prata por O Mestre (2012). Em Berlim, o Urso de Ouro por Magnólia e o Urso de Prata por Sangue Negro. Licorice Pizza também ganhou prêmio na Europa: o Bafta, da Academia Britânica, de melhor roteiro original.
Ambientado em 1973, o filme é carregado de nostalgia, a começar pela cor empregada pela direção de fotografia coassinada pelo cineasta com Michael Bauman, passando pelos figurinos muito fidedignos de Mark Bridges e chegando à seleção musical: Life On Mars? (David Bowie), Let me Roll It (Paul McCartney & The Wings), But You're Mine (Sonny & Cher), Peace Frog (The Doors)... Anderson, que nasceu em 1970, inspirou-se em histórias contadas por Gary Goetzman, hoje um produtor cinematográfico de 69 anos, para criar o personagem Gary Valentine, 15. Goetzman foi um ator infantojuvenil que contracenou com Lucille Ball e Henry Fonda em uma comédia bem-sucedida nas bilheterias, Os Seus, os Meus e os Nossos (1968), sobre um viúvo com 10 filhos que se casa com uma viúva com oito filhos. Também era um empreendedor precoce: como vemos no filme, de fato abriu uma empresa de camas d'água e um fliperama.
O protagonista é interpretado pelo estreante Cooper Hoffman, indicado ao Globo de Ouro. Hoje com 19 anos, ele é filho de Philip Seymour Hoffman (1967-2014), ator que ganhou o Oscar por Capote (2005) e colaborou com Paul Thomas Anderson em cinco filmes, como Boogie Nights e O Mestre (por este, concorreu à estatueta dourada de melhor coadjuvante). Ver e ouvir Cooper é como ver e ouvir uma versão remoçada do pai: ao mesmo tempo, podemos ser envoltos pela dor de uma saudade tremenda e pela promessa de um futuro radiante.
Gary nutre uma paixão platônica por Alana Kane. O principal empecilho é que ela é 10 anos mais velha — já está com 25. Com uma energia tão contagiante quanto a de Cooper Hoffman, o papel é vivido por outro nome novo no cinema: a cantora Alana Haim, 30, integrante da banda Haim, da qual Paul Thomas Anderson já dirigiu videoclipes, e indicada ao Bafta de melhor atriz.
PTA adota uma narrativa episódica em Licorice Pizza. A trama é pouco objetiva e dada a imprevistos, uma coleção de memórias não necessariamente conectadas umas às outras. Algumas empolgam, como as aventuras bizarras de Gary e Alana. Outras são questionáveis, como as cenas supostamente cômicas — e definitivamente sobrantes nos 133 minutos — de um empresário branco com suas esposas japonesas.
Mas o prato servido por Licorice Pizza é saboroso para quem gosta da mitologia de Hollywood. No filme, Sean Penn encarna um dos coadjuvantes, Jack Holden, uma paródia de Willian Holden, oscarizado por Inferno Nº 17 (1953). Graças ao negócio das camas d'água, Gary Valentine conhece o excêntrico Jon Peters, em atuação perversamente divertida de Bradley Cooper (indicado como ator coadjuvante no SAG Awards). Então cabeleireiro e maquiador das celebridades e namorado da atriz e cantora Barbra Streisand, Peters estava às vésperas de ingressar na carreira de produtor cinematográfico com Nasce uma Estrela (1976). E é aos pés do letreiro de um cinema que exibe Com 007 Viva e Deixe Morrer (1973) que ocorre uma cena arrebatadora.