Meu amigo David Coimbra adorava Roma (2005-2007), série em duas temporadas — a primeira com 12 episódios, e a segunda, com 10 — disponível na HBO Max. Assim ele escreveu em agosto de 2020:
"Gosto de séries baseadas em fatos históricos. Roma talvez tenha sido a melhor. A reprodução da vida privada da Antiga Roma é fiel e minuciosa, uma aula de história. Claro que a trama segue seu próprio curso fictício, mas há muito de realidade no que é narrado. Os dois protagonistas, os soldados Voreno e Pulo, existiram mesmo. São os únicos legionários citados por Júlio César em seu livro sobre a guerra gaulesa. Tinha esse livro e o perdi nas mudanças tantas. Agora só o encontro em latim, e latim, definitivamente, não é o meu forte. Triste".
Coproduzida pela HBO junto à BBC, do Reino Unido, filmada na Itália (sobretudo nos lendários estúdios Cinecittà, na capital) e com cada temporada orçada em US$ 100 milhões, a série mostra a história da formação do Império Romano pelos olhos de dois soldados, entre os anos 52 antes de Cristo e 30 a.C. O certinho e casado Lucius Vorenus (vivido por Kevin McKidd, que depois ficaria famoso como o doutor Owen Hunt de Grey's Anatomy) e o brigão e mulherengo Titus Pullo (Ray Stevenson, o Volstagg dos filmes do Thor) são nossos guias nos conturbados últimos anos do governo de Júlio César (Ciarán Hinds, indicado ao Oscar 2022 de coadjuvante por Belfast). Os dois acabam conquistando a simpatia de César e se envolvem nas suas reuniões com Cleópatra (Lyndsey Marshal), Marco Antônio (James Purefoy), Brutus (o ótimo Tobias Menzies), Otávio (Max Pirkis), o adesista Cícero (David Bamber) e outras figuras notórias daquele período.
A série foi criada por Bruno Heller, John Milius e William J. MacDonald. A direção dos episódios ficou a cargo de realizadores como Allen Coulter, de A Família Soprano, Alan Poul, de Six Feet Under, e Mikael Salomon, de Band of Brothers. Ao todo, ganhou sete prêmios Emmy — os principais foram os de direção de arte (nas duas temporadas) e fotografia (na segunda).
À época da estreia, o consultor histórico Jonathan Stamp disse que foi feito o possível em nome da autenticidade — do comportamento dos personagens a seus gestos, o tipo de rua em que caminhavam, suas vidas privadas e públicas:
— É importante encontrar pequenas pistas e a partir daí abstrair. As três fontes são arqueológicas: as ruínas de Pompéia e Herculaneum, referências literárias e inscrições em tumbas — afirmou, referindo-se especialmente à pesquisa sobre os hábitos das pessoas humildes, pouco documentados.
Embora mantenha a mania hollywoodiana de imprimir sotaque britânico a papéis de época, Roma evita uma série de lugares-comuns. Por exemplo: as ruas não são limpas e organizadas como se via no cinema de antigamente, mas fétidas e tumultuadas. E, ao contrário do que poderia imaginar o espectador de filmes como Calígula (1979) e Gladiador (2000), há bem menos violência e sexo — a força do seriado são suas intrigas políticas.
Spoilers pela frente para quem desconhece a história e a História.
A segunda temporada começa de onde terminou a primeira: estamos no ano 44 antes de Cristo, e o corpo de César banha de sangue o Senado após o ditador ser apunhalado por Brutus e outros "homens honrados" — como ironiza o general romano Marco Antônio no célebre discurso da peça Júlio César, de Shakespeare (tais palavras, contudo, não são ditas pelo Marco Antônio da série).
Então, o inteligentíssimo Otávio, filho da manipuladora Atia (Polly Walker), sobrinha de César, e futuro imperador romano, convence Marco Antônio — que quer "devorar o fígado" dos traidores — a propor uma anistia a Brutus, que se encontra em um "impasse jurídico". Diz Otávio:
— Brutus deve declarar César um tirano, do contrário, matá-lo seria assassinato. Mas todo ato de um tirano é ilegal, inclusive indicar Brutus como pretor, Cássio como procônsul, e assim por diante. Se Brutus honrar a lei, perderá hierarquia e posição.