Antes de falar sobre Noite Sem Fim (Run All Night, 2015), em cartaz no Domingo Maior da RBS TV neste fim de semana, que tal relembrar como tudo começou?
— Eu não sei quem você é. Eu não sei o que você quer. Se está em busca de resgate, saiba que não tenho dinheiro. O que eu tenho são habilidades muito específicas, habilidades que eu adquiri ao longo de uma carreira muito longa. Habilidades que fazem de mim um pesadelo para pessoas como você. Se você libertar minha filha agora, encerramos o assunto. Não vou te procurar ou te perseguir. Mas se você não a libertar, eu vou te procurar, eu vou te achar e eu vou te matar.
Foi com esse monólogo — e com a posterior colocação em prática das ameaças — que Liam Neeson pavimentou uma transformação na carreira ainda mais tardia do que a de Charlize Theron, alçada ao posto de heroína dos filmes de ação depois dos 40 anos. O ator norte-irlandês que concorreu ao Oscar por A Lista de Schindler (1993) e ganhou a Copa Volpi por Michael Collins (1996), no Festival de Veneza, já tinha 56 quando estrelou Busca Implacável (2008). Nesse título dirigido pelo francês Pierre Morel e bem-sucedido nas bilheterias (foram US$ 226,8 milhões arrecadados, quase 10 vezes o custo de produção), ele estabeleceu o tipo de personagem que inscreveu o seu nome na galeria de astros do gênero: o ex-agente secreto ou ex-policial que precisa voltar à ativa e tomar medidas extremas quando sua família corre perigo. Contribuem para o fascínio — ou o espanto — exercido por Neeson suas características físicas (1m93cm de altura, o nariz grande e torto desde que o quebrou nos tempos de boxeador, na juventude), a voz grave, um olhar capaz de exalar tanto a fúria quanto a frieza e um meio sorriso que contrasta as barbaridades cometidas com suas próprias mãos.
Com algumas variações, de lá para cá Neeson protagonizou uma dezena de histórias de violência e vingança, até anunciar sua aposentadoria do gênero, em janeiro de 2021, alegando dificuldades, pelo peso da idade (vai fazer 70 em junho), para fazer as cenas de luta. Mas não durou muito esse afastamento, vide Na Mira do Perigo (2021), Agente das Sombras (2022) e o vindouro Memory. Ele também será visto como o célebre detetive criado pelo escritor Raymond Chandler em Marlowe, de Neil Jordan.
Entre os filmes anteriores, estão as duas sequências da franquia Busca Implacável (em 2012 e em 2014), o ótimo, mas brutal Vingança a Sangue Frio (2019) e quatro colaborações com o diretor espanhol Jaume Collet-Serra: Desconhecido (2011), Sem Escalas (2014), Noite Sem Fim (2015) e O Passageiro (2018).
Em Noite Sem Fim, que será exibido pela RBS TV à 0h45min de segunda-feira (18), Neeson interpreta um personagem recorrente: o tipo casca-grossa dono de habilidades especiais e atormentado por traumas passados, os quais amortece na solidão e na birita. Jimmy Conlon é matador da máfia irlandesa de Nova York, traumatizado pela rejeição do filho que abandonou quando criança para cumprir seu ofício e ganhar a fama ruim que tem.
Mike, o filho (Joel Kinnaman), cresceu longe do crime e dirige limusine para sustentar a mulher e duas meninas pequenas. Mas o rapaz será sugado involuntariamente pela espiral de violência patrocinada por Shawn Maguire (Ed Harris), o chefão para quem o pai trabalha. Jimmy escolhe um lado: proteger Mike e sua família, o que faz ambos serem caçados por gângsteres e policiais corruptos, na tradicional gincana que deixa como rastro uma fileira de destruição e corpos.