É fácil subir à tribuna e discursar contra o aumento da taxa de juros, ou gravar videozinho dizendo que é preciso aumentar a taxa Selic porque o governo mau quer reduzir o Imposto de Renda de quem ganha abaixo de R$ 5 mil. É isso o que fazem os deputados quando, em vez de dar prioridade ao pacote de corte de gastos, passam à frente pautas irrelevantes para pressionar o governo a acelerar a liberação das famigeradas emendas.
Ninguém é obrigado a gostar do pacote encaminhado pelo ministro Fernando Haddad para ajudar as contas públicas. É direito de cada parlamentar criticar o governo por ter misturado os cortes de gastos com o cumprimento da promessa de isentar de Imposto de Renda os ganhos até R$ 5 mil. O Congresso existe para fazer leis, fiscalizar o governo e melhorar as propostas que vêm do Executivo. Só que em vez de aprimorar o pacote, os parlamentares retardaram a apreciação e contribuíram para o clima de caos que antecedeu a reunião do Copom e a paulada na cabeça de quem precisa tomar empréstimos.
Se está comprovado que o cachimbo entorta a boca, é cada vez mais visível que os deputados viciados em emendas perderam o foco no olhar. Como as emendas sustentam seus mandados e garantem sucessivas reeleições, não é preciso trabalhar pelos temas de interesse da Nação e do Estado. Esse olhar distorcido impede que os deputados e senadores do Rio Grande do Sul percebam que estão conformados em ser coadjuvantes — talvez seja mais preciso dizer irrelevantes.
Não bastasse deixarem vencer medidas provisórias que fazem a diferença na vida dos eleitores e das empresas, omitem-se em comissões como a da reforma tributária e se envolvem menos do que deveriam na reconstrução do Estado. As emendas são impositivas, o que em tese acaba com o troca-troca por votos, mas há uma espécie de vingança do Congresso diante da exigência de transparência, feita pelo ministro Flavio Dino, do Supremo Tribunal Federal, que segurou a liberação até a adoção de providências para que o cidadão tenha acesso às informações sobre a origem e o destino dos recursos públicos.
Quem paga imposto tem o direito de saber para onde vai o dinheiro das emendas — individuais, de bancadas ou de comissões. Não pode existir orçamento secreto nem camuflado. Dinheiro público é de todos, embora tenha quem acredite que se é público não é de ninguém e, logo, pode ser desviado para o seu curral eleitoral.