A leitura do relatório da senadora Eliziane Gama (PSD), relatora da CPI do 8 de janeiro, confirmou o que estava previsto desde a instalação da comissão, goela abaixo do governo: que daria em nada. É ilusório achar que a CPI terá o poder de fazer o Ministério Público Federal se mexer, só porque pediu o indiciamento do ex-presidente Jair Bolsonaro como mentor dos atos golpistas que resultaram na depredação do Palácio do Planalto, do Congresso e do Supremo Tribunal Federal (STF).
A CPI serviu de palco para o pugilismo político, mas acrescentou nada de novo ao que a Polícia Federal apurou e está em estágio mais avançado. Foram os bolsonaristas que insistiram na criação da CPI, imaginando que conseguiriam aplicar, como em outros tempos, narrativas estapafúrdias, como a de que os vândalos eram inocentes militantes e senhoras com a Bíblia embaixo do braço que caíram numa cilada dos governistas.
Bolsonaro e seus seguidores fingem que acreditam nessa lorota porque a narrativa lhes é conveniente, mas não para em pé. Houve falhas da segurança do Palácio do Planalto, mas a invasão só ocorreu porque a turba que marchou em direção à Praça dos Três Poderes estava programada para criar o caos, na esperança de que isso obrigasse as Forças Armadas a intervirem. É fato que a Polícia Militar do Distrito Federal facilitou a marcha, porque estava desmobilizada, mas ninguém que destrói o plenário do Supremo, quebra esculturas e perfura quadros valiosos o faz por inocência ou porque encontrou a porta aberta.
Desde o próprio 8 de Janeiro a Polícia Federal tem um vasto arquivo de imagens que mostram a fúria dos golpistas e sua sanha destruidora. Havia método em meio ao caos, ainda que alguns dos manifestantes parecessem um tanto perdidos. Por ignorância ou certeza de que ficariam impunes se o golpe desse certo, os vândalos produziram provas contra si postando vídeos da baderna, como se invadir a esplanada do Congresso, quebrar mesas e cadeiras do Supremo ou arrebentar objetos no Planalto fossem prova de fidelidade ao governo derrotado nas urnas.
O governo tentou evitar a CPI porque entendia que ela atrapalhava as votações, mas a comissão não conseguiu ser centro das atenções na maior parte do tempo. Os bolsonaristas acham que o problema foi o boicote da mídia, que não comprou a versão segundo a qual naquele dia o presidente Lula foi a Araraquara "em ter nada para fazer lá", como parte da estratégia de deixar o Planalto aos cuidados de um incompetente Gabinete de Segurança Institucional (GSI).
Lula foi a Araraquara para prestar solidariedade ao prefeito Edinho Silva, que naquele fim de semana enfrentava as consequências de uma enchente, mas quem convencerá os que vivem no mundo da fantasia e preferem acreditar na versão porque os fatos não têm graça?
A oposição vai continuar dizendo que o ministro da Justiça, Flávio Dino, se recusou a entregar imagens das câmeras de segurança em uma tentativa de queima de arquivo. Tem provas? Não, apenas suposições e a alegação do ministro de que as imagens foram apagadas porque confirmariam a omissão de Dino e de sua equipe.
Eliziane Gama também pediu o indiciamento dos generais Augusto Heleno, Braga Netto e Luiz Eduardo Ramos, por terem supostamente conspirado. Haverá alguma consequência? Só se a Polícia Federal tiver provas contra eles. A CPI ficou na falação. Anderson Torres, outro indiciado, não foi exposto pela CPI, mas pela Polícia Federal.