O Progressistas (PP) pode alegar razões humanitárias para ter dado aval à candidatura de José Otávio Germano à prefeitura de Cachoeira do Sul, em 2020, mas seria mais sincero admitir que foi oportunismo político. O partido conhecia os escândalos em que seu candidato se envolvera, mas ainda podia alegar que, não tendo sido condenado em segunda instância, estava legalmente autorizado a concorrer. É verdade, mas o PP também estava ciente de que José Otávio era um homem que precisava de tratamento médico e não de um cargo público.
Ah, mas os eleitores de Cachoeira quiseram assim, dirão os líderes do PP. Também é verdade, mas os eleitores talvez não estivessem devidamente informados sobre a gravidade da situação. Ou estavam e não se importaram, dada a força do nome Germano no município. Não é novidade para ninguém do PP que José Otávio era dependente químico e não estava curado. O vício não foi o motivo do seu afastamento do cargo nesta quinta-feira (28), mas os indícios de corrupção envolvendo licitações nas secretarias de maior orçamento.
Por que cita-se a dependência química, neste caso se o afastamento se deu por suspeita de corrupção? Porque ela deveria ser um impeditivo para o PP autorizar a candidatura. Os partidos são responsáveis por aqueles a quem indicam para os cargos. Uma pessoa alterada por substâncias químicas não tem condições de governar uma cidade — e talvez a defesa do prefeito afastado use esse argumento para justificar a assinatura de contratos suspeitos.
Os problemas do ex-deputado vêm de longe. Ele foi um dos principais envolvidos no escândalo do Detran, mas escapou porque a Polícia Federal cometeu uma barbeiragem jurídica. Como ele tinha foro privilegiado na condição de deputado federal, a operação de busca e apreensão só poderia ter sido feita com autorização do Supremo Tribunal Federal. Não foi, e isso garantiu a anulação das provas. A investigação acabou indiciando pessoas próximas a ele, como o então diretor-geral do Detran, Flavio Vaz Neto, o assessor Carlos Ubiratã dos Santos, o ex-diretor-geral da Assembleia, Antônio Dorneu Maciel, entre outros menos conhecidos.
O escândalo do Detran respingou até em quem não tinha envolvimento, como um dos irmãos de José Otávio, advogado e professor respeitado que perdeu o emprego pelo parentesco e porque o endereço do seu escritório foi citado em uma conversa grampeada com autorização judicial.
José Otávio também foi investigado na Operação Lava-Jato. Em um dos processos, o Supremo Tribunal Federal o inocentou, por unanimidade. Outros foram adiante e o Tribunal Regional Federal da 4ª Região chegou a determinar o leilão de sua casa na praia de Xangri-Lá, mas as três tentativas de vender o imóvel fracassaram por falta de interessados. Em 2018, tentou se reeleger deputado federal mas fracassou. Fez somente 27.377 votos (o último eleito do PP, Jerônimo Goergen, entrou com mais de 89 mil).
Sem prejulgar, até porque o inquérito está em segredo de Justiça e não se conhecem as provas colhidas pelo Ministério Público, mas o PP está em uma encrenca que o novo presidente, Covatti Filho, terá de resolver. A um ano da eleição, o PP de Cachoeira do Sul precisará encontrar outro candidato a prefeito, que inevitavelmente carregará o desgaste pelos erros de José Otávio Germano.