A quitação do estoque de R$ 15 bilhões de precatórios até 2029 é um dos principais subprodutos da adesão do Rio Grande do Sul ao regime de recuperação. Como isso será feito? Com a destinação anual de uma parcela da receita para quitar essas dívidas e com um empréstimo de US$ 500 milhões (cerca de R$ 3 bilhões) do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).
Dito assim, a conta não fecha. Afinal, se ao longo do ano o Estado destina somente algo como R$ 700 milhões para o pagamento de precatórios, como quitar R$ 15 bilhões em sete anos se o empréstimo será de R$ 3 bilhões e ainda entram entre R$ 300 e R$ 400 milhões de novos títulos a cada ano? O secretário da Fazenda, Marco Aurelio Cardoso, explica que o segredo está na palavra “deságio”.
Normalmente, os precatórios são pagos por ordem de antiguidade, como se fosse uma fila que se move lentamente. Quem está mais para trás na fila, pode receber antes se concordar em dar um desconto para o governo. Na prática, é o que hoje as pessoas fazem vendendo seus precatórios a terceiros por medo de morrer sem receber a conta. Há casos de pessoas que vendem seus precatórios no mercado paralelo por valores irrisórios, como 20% do valor devido.
Em dezembro, quando anunciou a operação de crédito, o então governador Eduardo Leite disse que a ideia é conseguir deságio de até 40%, o que permitiria, com R$ 3 bilhões, abater entre R$ 5 e R$ 6 bilhões do estoque.
A adesão ao regime de recuperação fiscal impede o Estado de tomar empréstimos, mas há exceções. A principal delas é para pagar passivos como salários atrasados e precatórios. Como os salários estão em dia, o Piratini quer usar essa folga para pagar pessoas que entraram na Justiça contra o Estado, ganharam e a ação transitou em julgado, mas ainda não conseguiram receber. Boa parte desses débitos é decorrente de ações da chamada Lei Britto — um aumento dado pelo ex-governador Antônio Britto em 1995 foi revogado sem lei específica e deu origem a uma enxurrada de ações.
ALIÁS
O programa de quitação dos precatórios vai secar um filão explorado por dezenas de escritórios de advocacia que compram precatórios a preço de banana de quem está com a corda no pescoço porque podem esperar para receber quando chega a vez na fila ou revendem por valor maior para pagamento de dívidas.
Sem segredo ou caixa preta
Um dos arquitetos das reformas que permitiram ao Rio Grande do Sul aderir ao regime de recuperação fiscal, o secretário da Fazenda, Marco Aurelio Cardoso, repudia com veemência as acusações dos adversários do governo de que exista uma “caixa preta” no acordo com a União.
— Não existe cláusula secreta nem contrato escondido em caixa preta. Todas as informações são públicas e estão em um site próprio, à disposição de quem quiser estudá-las — diz o secretário.
Gesso por falta de dinheiro
Em resposta à afirmação dos pré-candidatos que contestam a adesão ao regime com o argumento de que os próximos governadores ficarão engessados e impedidos de investir o secretário Marco Aurelio sustenta que “gesso é não poder investir por falta de dinheiro”.
Sem regime de recuperação fiscal, o Estado atrasou salários, não conseguiu pagar a dívida nem fazer investimentos. Isso sim é engessamento. O regime não impede o governo de fazer investimentos nem de dar reajuste salarial, desde que prove ter dinheiro para isso sem aumentar impostos.