O jornalista Henrique Ternus colabora com a colunista Rosane de Oliveira, titular deste espaço.
Durou mais de uma hora a primeira discussão de 2025 na Câmara Municipal, com clima belicoso entre os vereadores da esquerda, os da direita e a presidente da Casa, Comandante Nádia (PL). Na pauta estavam os projetos de reforma administrativa do prefeito Sebastião Melo, mas os vereadores optaram por começar debatendo os lugares que ocupariam no plenário.
Após assumir a presidência, Nádia encaminhou o chamado "espelho de classe", tal qual ocorre nas escolas de Ensino Fundamental. Na proposta inicial, os parlamentares seriam alocados de acordo com a ideologia: os vereadores da esquerda ficariam à esquerda, os da direita à direita e os de centro ao centro, em uma análise ideológica proposta pela presidente.
Tal alteração causou desconforto entre os membros mais antigos da Casa e nas bancadas de PT, PSOL e PCdoB, que ocupam os mesmos assentos desde outras legislaturas. O argumento é de que, em outras oportunidades, os vereadores reeleitos permaneciam nos mesmos assentos, enquanto os novos teriam seus lugares definidos por sorteio. Nos bastidores, houve uma votação entre os líderes, na qual os da esquerda foram voto vencido.
Nesta segunda-feira (6), os vereadores resgataram o assunto para a sessão, propondo a deliberação por todos os parlamentares sob o argumento de que "o plenário é soberano", como disse Pedro Ruas (PSOL). O colega de partido, Roberto Robaina, pediu para iniciar a discussão do tema e Nádia, provocativa, abriu a votação:
— Já que nós não temos um acordo, e que os líderes foram vencidos por voto, e o vereador Robaina quer discutir o que tem mais de importante na cidade que é o lugar dele sentar nessa Casa, assim nós vamos fazer. Vamos discutir o que tem de mais importante que tem nessa Casa, que é o lugar de cada vereador sentar.
Por mais de 30 minutos, os parlamentes da esquerda defenderam a manutenção dos lugares, sem as alterações propostas pela presidência, e aproveitavam para cutucar Nádia chamando-a de "presidenta" — expressão rejeitada na direita pela referência à ex-presidente Dilma Rousseff. Tais manifestações, aliadas com o plenário lotado de servidores e sindicalistas, colaboraram para testar a paciência de Nádia durante o comando da sua primeira sessão. A vereadora respondia em tom combativo, por vezes interrompendo as falas dos colegas.
Na votação, o requerimento de Robaina foi rejeitado sem os votos da esquerda. Aldacir Oliboni (PT) tentou justificar a ausência:
— A esquerda não vota porque não reconhece esse tipo de requerimento, porque não consta no regimento interno. Essa votação, que foi feita agora, não tem validade pra nós, por isso nós vamos recorrer — argumentou Oliboni, para o espanto de Nádia.
— O vereador Robaina, então, fez um requerimento que não tem validade? Só para mim (sic) entender. Vereador, o senhor reconhece isso que o senhor fez um requerimento sem validade, e que está colocando todos os vereadores aqui como palhaços nesse momento, no momento que Porto Alegre precisa trabalhar? — questionou a presidente.
Em resposta, Robaina explicou que contestou a proposta do espelho do plenário por ser a primeira vez que deparava com tal medida, e aproveitou para devolver as provocações:
— Gostaria de primeiro esclarecer que jamais e em nenhum momento pensei em fazer qualquer ofensa à categoria profissional dos palhaços comparando com alguns vereadores. Jamais desrespeitaria qualquer categoria profissional. A senhora esteve na posse fardada, mas a Câmara de Vereadores não é um quartel. A senhora não pode desrespeitar, não escutar, não tentar ter algum diálogo. Nós fizemos aqui uma luta política contra o autoritarismo e continuaremos fazendo enquanto a senhora exercer a presidência da forma que acha que deve.
Toda a discussão sobre os lugares, motivada e alimentada pela esquerda, foi uma estratégia das bancadas para garantir tempo até que a Justiça concedesse uma liminar suspendendo as sessões extraordinárias. A decisão garante que as medidas sejam submetidas a audiências públicas antes de irem à plenário.
A sessão foi a primeira amostragem da nova legislatura, que tem mais representantes polarizados — as bancadas de esquerda têm 12 vereadores e o PL saltou de uma para quatro cadeiras — e uma presidente conhecida pelos atritos com os colegas de esquerda.