É da natureza do presidente Jair Bolsonaro e de seus filhos atropelar a diplomacia e tomar partido nas eleições de outros países, como se essa opinião tivesse algum poder de influência sobre os eleitores. É legítimo que o presidente tenha preferência por este ou aquele candidato nas disputas em países com os quais o Brasil tem relações comerciais, mas engajar-se na campanha e difamar o adversário pode significar prejuízo, caso vença aquele que foi execrado publicamente.
Na disputa entre Donald Trump e Joe Biden, Bolsonaro se algemou ao presidente dos Estados Unidos antes de saber quem seria o adversário. Por afinidade ideológica e identificação com o estilo rude de Trump, aderiu sem ressalvas, até porque antes da pandemia nada indicava que um democrata tivesse chance de vencer a eleição.
Bolsonaristas convictos e conselheiros do presidente sustentam que, se o Brasil tem a pretensão de liderar a América do Sul, ele deve, sim, se envolver com as eleições no continente e assumir posição. O problema é que a torcida, às vezes, atrapalha mais do que ajuda.
Nas eleições argentinas, Bolsonaro escolheu Mauricio Macri, opção natural diante do perfil esquerdista do adversário Alberto Fernández. Os argentinos não deram a mínima para a opinião do presidente brasileiro e escolheram Fernández. Bolsonaro se recusou a comparecer à posse, ameaçou romper com o Mercosul e nada ganhou com as indelicadezas.
Na eleição americana, a preocupação dos brasileiros deve ser com o que Bolsonaro dirá no dia seguinte, caso Trump não seja reeleito ou resolva contestar na Justiça o resultado das urnas. As relações entre os dois países são sólidas e não precisam de subserviência a quem ocupa a Casa Branca.
Quem vencer esta eleição singular terá mais com que se preocupar do que com a simpatia ou antipatia do presidente brasileiro. Caso Biden seja o vencedor, a tendência é de que aumentem as pressões pela preservação da Floresta Amazônica, um tema incômodo para o governo brasileiro, mas nem por isso os americanos deixarão de comprar e vender o que for do seu interesse.
Assim como a adesão incondicional a Trump não trouxe vantagens reais para o Brasil, a rejeição a Biden não será um desastre em caso de vitória do democrata, mas não é recomendável queimar pontes.