Menos de 24 horas depois de o Supremo Tribunal Federal decidir que o cumprimento da pena só deve começar após o trânsito em julgado da sentença, o ex-presidente Lula ganhou a liberdade após 580 dias detido na sede da superintendência da Polícia Federal em Curitiba. Depois dele, outros presos condenados na Operação Lava-Jato devem ganhar as ruas nos próximos dias, a menos que tenham prisão preventiva decretada.
Em Minas Gerais, o ex-governador Eduardo Azeredo (ex-PSDB), também teve o alvará de soltura assinado na tarde desta sexta-feira (8). Nas ruas, farão companhia a corruptos e corruptores que se safaram graças a acordos de delação premiada firmado com o Ministério Público ou com a Polícia Federal e avalizados pela Justiça.
Fora da cadeia, Lula pode atrapalhar os planos de Jair Bolsonaro de aprovar as reformas liberais encaminhadas ao Congresso? É cedo para dizer, porque a força da oposição no parlamento já se mostrou bastante limitada.
Lula também não tem poder para reanimar os sindicatos, que estão asfixiados pela falta de dinheiro, mas os líderes do PT acreditam que ele ainda seja capaz de, pela palavra, mobilizar multidões contra projetos impopulares. Pelo sim, pelo não, o mercado se alarmou e, desde que foi autorizada a saída da prisão, o dólar subiu e a Bolsa caiu.
Lula está livre, mas segue com a ficha suja e, portanto, impedido de ser candidato na eleição de 2022. Na campanha do próximo ano, será, paradoxalmente, cabo eleitoral dos candidatos apoiados pelo PT e dos seus adversários.
Explica-se: os petistas usarão a figura do ex-presidente para tentar conquistar os votos dos simpatizantes e dos saudosistas do seu governo. Os adversários usarão a liberdade de Lula para reforçar o antipetismo, que foi decisivo na eleição do presidente Jair Bolsonaro em 2018.
O clima de radicalização que tomou conta do país não permitirá que Lula desfrute da liberdade que acaba de conquistar. Por questões de segurança, não deverá circular em caravanas pelo Brasil, como seria o desejo dos seus aliados.
Convém lembrar que, antes de ser preso, Lula enfrentou protestos em roteiro pelo sul do Brasil, com cenas de violência em cidades como Bagé e Passo Fundo, no Rio Grande do Sul, e até tiros em ônibus no interior do Paraná.
Com a decisão do Supremo contra o início do cumprimento da pena após a condenação em segunda instância, o foco agora se transfere para o Congresso, onde já tramitam propostas alterando a Constituição para permitir que condenados possam ser presos antes do julgamento de todos os recursos previstos na legislação penal.
Deputados e senadores favoráveis à prisão após a segunda instância querem aproveitar o clima de comoção causado pela decisão do Supremo e pela soltura de Lula para apressar a votação das emendas, mas é improvável que sejam aprovadas.
Em primeiro lugar, porque é difícil obter 308 votos na Câmara e 54 no Senado para mudar a Constituição em um ponto sensível para boa parte dos congressistas. Em segundo lugar, porque em pouco mais de um mês a Câmara e o Senado entram em recesso e, na volta, em fevereiro, a pauta será outra.
Aliás
A grande ausente no palanque improvisado de Lula em Curitiba foi a ex-presidente Dilma Rousseff, que estava em um encontro da esquerda em Buenos Aires e sequer foi citada. Na Argentina, Dilma comemorou saída de Lula da prisão.