Foi preciso o presidente Michel Temer admitir publicamente a dificuldade de aprovar a reforma da Previdência para o senhor mercado acreditar no que está claro há muitos meses: o governo não tem os votos necessários. Diante da reação do senhor mercado, com queda na Bolsa e alta no dólar, foi preciso acionar a tropa de choque para reduzir o tamanho do sinistro provocado pela sinceridade presidencial. Das reuniões e pronunciamentos em vídeo saiu a promessa de que as mudanças na Previdência seguem na agenda e que, se para aprová-las for preciso uma reforma ministerial, Temer fará.
A reforma ministerial é necessária porque o PSDB está com um pé fora do barco e o outro levantado para dar o próximo passo. Em tese, a saída do PSDB não é empecilho à reforma, porque os principais líderes do partido dizem que, para votar no que acreditam, não precisam estar nos ministérios. O problema é outro: o governo se comunica mal e carece de legitimidade para aprovar projetos polêmicos às vésperas de uma eleição geral.
Já é certo que a proposta ousada encaminhada ao Congresso, e que já havia sido desidratada ao longo do tempo, vai se desmilinguir ainda mais para ter alguma chance de aprovação. Ainda assim, nada garante que seja aprovada, dado a resistência dos trabalhadores que serão afetados pelas mudanças e o medo visceral que deputados e senadores têm de se queimar com o eleitor.
Temer perdeu a batalha da comunicação porque não conseguiu um discurso coeso para contrapor a retórica da oposição de que a Previdência não tem déficit. Em um país pouco acostumado a planejar o futuro e sem tradição de poupança, não funcionou repetir o mantra de que existe o risco de os aposentados não receberem o benefício daqui a alguns anos. Para piorar as coisas, Temer e seus ministros tratam a reforma da Previdência como um projeto de combate aos privilégios.
Soa como piada falar em combate aos privilégios quando os afetados serão os trabalhadores do setor privado, que majoritariamente se aposentam com o salário mínimo. Pouquíssimos conseguem alcançar o teto de cerca de R$ 5 mil. Proporcionalmente, o grande rombo da Previdência está no setor público, que terá regras iguais, mas a proposta de reforma já nasceu com exceções que minam a credibilidade. Os militares, por exemplo.
A aprovação da reforma previdenciária já era considerada difícil antes do escândalo Joesley Batista. As duas denúncias da Procuradoria-Geral da República sugaram a energia do Planalto. Para salvar o mandato, Temer gastou capital político e financeiro, ao abrir as torneiras dos ministérios para contemplar demandas dos aliados.
Sem a reforma, dizem os ministros, o teto de gastos vira letra morta ou, em poucos anos, toda a arrecadação será canalizada para o custeio, sem margem para investimentos. Um arremedo de reforma, restrito à idade mínima e a questões cosméticas, pode acalmar o mercado financeiro, mas a parte dura ficará para o próximo presidente, empoderado pelas urnas.
Aliás
A substituição de Leandro Daiello no comando da Polícia Federal é um alento para os que desejam estancar a sangria da Lava-Jato. Desde antes do impeachment, a cabeça do delegado vinha sendo pedida pelos incomodados com seu excesso de independência.