O jornalista Vitor Netto colabora com o colunista Rodrigo Lopes, titular deste espaço.
Com a vitória de Donald Trump nas eleições americanas, um novo capítulo se inicia a partir de janeiro, quando ele tomará posse.
Mas como ficará a relação com o Brasil? Sobre isso e outros assuntos, a coluna conversou com o cientista político, sociólogo e pesquisador Alberto Carlos Almeida.
O que a eleição do Trump representa para os Estados Unidos?
Uma pesquisa de boca de urna da CNN mostrou que o resultado, na verdade, teve relação com o desempenho da economia. Dois terços dos americanos estavam avaliando que a situação deles estava pior do que melhor. Eles comparam três eleições, então basicamente foi o que aconteceu. O Trump saiu (em 2020) por causa do desempenho da economia e voltou por causa do desempenho da economia. E é um presidente, a não ser que ele mude a lei, de um mandato só, não pode ser reeleito.
Há outros políticos da direita que emergiram no poder. Javier Milei na Argentina, partido de Marine Le Pen na França ganhou força, entre outros... Há, no mundo, uma força da direita emergindo?
Eu não vejo onda. Vejo assim: o PSOE (Partido Socialista Operário Espanhol) está na Espanha e disputa com o PP (Partido Popular), que é moderado. O partido trabalhista acabou de ganhar na Inglaterra, a Alemanha é o partido social-democrata. Na Itália ela (primeira-ministra Giorgia Meloni) foi eleita pela direita, mas ela faz um governo menos pela direita do que o discurso dela. Na França, a própria Marine Le Pen, na eleição passada, se moderou bastante. Todo mundo analisa as imagens que essas figuras constituíram no passado, congelaram a imagem do passado, mas se você for atualizar para a imagem presente, ela mudou bastante, já foi muito mais extremada na primeira eleição que ela disputou do que na segunda, porque viu que para vencer ela precisava se moderar. Eu vejo menos isso como uma onda, e muito mais como resultado de alternância do poder.
Trump vai colocar em prática tudo o que disse durante a campanha?
Não. Uma coisa é o que você fala na campanha, outra coisa é o que você faz no governo. Tem uma certa rigidez. Você pode falar qualquer coisa para mobilizar, falar coisas extremadas, foi assim da primeira vez também, quando chega no governo é mais complicado. Fazer um muro no México, faz um pedacinho do muro, mas não dá para fazer tudo. Foi o que aconteceu na primeira, então isso tende a se repetir. Você tem uma rigidez muito grande do sistema político, então assim, ele não vai fazer tudo que falou de jeito nenhum.
Como fica a relação do Brasil com os Estados Unidos a partir de agora?
O Lula é muito pragmático, já parabenizou a Trump, desejando sucesso ao governo e ao povo dos Estados Unidos. Vamos ver como vai se movimentar o Trump com relação a isso, temos que aguardar. O que eu acho assim é que nas últimas décadas os Estados Unidos têm conferido pouca importância para a América Latin. A América Latina como um todo, não é prioridade para os Estados Unidos, então precisamos ver se em algum momento vai ser, eu acredito que não, acho que vai mudar muito pouco. Talvez a coisa do protecionismo, o Trump tende a ter uma política comercial mais protecionista e aí o Brasil vai ter que multiplicar os parceiros comerciais, Trump vai ter que analisar isso, tem boas assessorias, porque isso vai jogar o Brasil mais ainda no colo da China. Mas isso é uma coisa que se vê, é o ponto de partida, não significa que vai ser realizado desse jeito.
O Brasil se aproximar da China não estremece a relação?
Não vejo muito estremecer, eu acho que os Estados Unidos é um parceiro comercial importante, nós estamos no hemisfério, na área de influência dos Estados Unidos, mas isso, eles nunca deram prioridade à América Latina de um modo geral, nem ao Brasil. Então pode ser que uma aproximação maior do Brasil com a China ou da própria América Latina faça com que os Estados Unidos dê prioridade, mas isso é algo aqui que não dá para botar na bola de cristal, não dá para prever. O que sabemos é esse risco que os Estados Unidos correm, digamos assim, apontando para um protecionismo maior, e isso tendo como consequência fazer com que todos os outros países, isso inclui o Brasil, se aproximem mais da China, e como os Estados Unidos vai reagir diante dessa eventualidade, é impossível dizer.
Os discursos contra os imigrantes pode gerar problemas para os brasileiros? Com vistos e deportações?
Pode criar, pode dificultar sim a entrada, isso daí eu não duvido que venha acontecer lentamente. Dificultar a entrada não significa impedir, não significa que vá diminuir o fluxo turístico de brasileiros para Nova Iorque, eu acho que isso tende a permanecer.
O que é importante que nós do Brasil fiquemos de olhando a partir de agora nesses próximos passos de Donald Trump?
Pouca coisa. Acho que entra dentro disso, é muito pouca coisa, porque a América Latina de fato não é uma prioridade, ela entra lá no fim da lista. A prioridade dele é Europa, China, Rússia, Oriente Médio, a América Latina fica bem no fim da fila.
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