Durante a COP29, em Baku, o presidente do Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP), o gaúcho Roberto Ardenghy, conversou com a coluna sobre o futuro dos combustíveis fósseis no momento em que, cada vez mais se fala em transição energética.
Como vocês se posicionam em uma COP, em que petróleo e gás são, em geral, vilanizados?
Os combustíveis fósseis foram importantes e, realmente, criaram essa condição de aumento de temperatura do planeta pela emissão do gás de efeito estufa. Mas, ao mesmo tempo, geraram um modelo de civilização desde a Revolução Industrial, em 1750, a partir do carvão, depois com petróleo e hoje cada vez mais com o gás natural. Nossa preocupação é como podemos limpar essa matriz energética, como ela pode ser mais sustentável e mais descarbonizada. É como se estivéssemos em uma escada, pouco a pouco você vai subindo. O Brasil já está bem em cima nessa escada, porque 43% da nossa energia já é renovável: hidrelétrica, solar, eólica. Ao mesmo tempo, somos capazes de produzir petróleo com baixa emissão de CO2.
Como fazer a transição, sendo que o setor do petróleo no Brasil é esteio da nossa estrutura energética?
O petróleo e seus derivados são um produto altamente confiável, têm uma carga energética muito importante. Veja o avião, por exemplo, que consegue atravessar o mundo usando um derivado de petróleo. Nenhum outro produto entrega esse serviço energético. Então, ele vai continuar sendo importante ainda, talvez não mais como mero gerador de energia, mas com uso industrial. Nossa preocupação é com a redução das emissões de CO2 a partir do petróleo. O mundo hoje consome 100 milhões de barris por dia de petróleo, vamos reduzir esse consumo para cerca de 60 milhões em 2050.
Como isso vai ocorrer?
Alguns países vão produzir petróleo e exportar, outros, não. O diferencial será a descarbonização, a emissão de CO2 por barril produzido.
O fato de o Brasil estar descarbonizando o processo, na frente de outros, abrirá mercado para o petróleo nacional?
Abre mercado, porque, no futuro, a demanda será pelo produto descarbonizado. Eles terão um valor intrínseco. Hoje, o barril de petróleo vale US$ 80, dependendo do tipo. Vai ter uma pegada de carbono. O comprador do petróleo vai perguntar: "Brasil, por quanto você vende esse barril? Quanto de carbono você emitiu? Porque preciso comprar um produto descarbonizado" Vai ter um valor intrínseco muito importante. O Brasil está muito bem posicionado. Graças a muita tecnologia, conseguimos reduzir a nossa emissão de CO2 por barril produzido de 25 quilos de CO2 por barri para 11. Cada vez estamos reduzindo mais, nos juntando aos principais países hoje que tem essa versão da descarbonização, como a Noruega e outros.
E o gás natural?
O gás natural tem essa importância grande porque é o combustível da transição energética. E temos no Rio Grande do Sul uma perspectiva positiva de produção de petróleo e gás natural na chamada bacia de Pelotas. Do lado de lá (do Oceano Atlântico), na África, já foi descoberta uma reserva importante na Namíbia de 6 bilhões de barris de petróleo. Os geólogos dizem que há uma boa perspectiva de descobertas ali. A Agência Nacional do Petróleo fez um leilão de áreas. Cerca de 22 blocos foram adquiridos pela Petrobras e por outras empresas internacionais e, nesse momento, está sendo feito o estudo geológico da região para ver se são identifica realmente depósitos relevantes de hidrocarbonetos. Pode ser a redenção do Estado.
Como avalia os veículos elétricos no Brasil?
Há 80 anos o mundo está tentando sair do carvão como gerador de energia e indo para os combustíveis mais descarbonizados, mas, mesmo assim, em países como Índia e China quase 50% da energia é gerada a partir do carvão. Muitas vezes não faz muito sentido ter um carro elétrico, se aquela energia que você está usando na sua casa, para abastecer o carro elétrico, vem do carvão. Ele vira apenas um veículo do carvão para ser usado na mobilidade. Por isso que a gente defende os biocombustíveis: etanol e biodiesel. Esses, sim, são produtos oriundos da agricultura, que têm essa pegada de emissão muito menor do que o carvão.
No documento da nova NDC brasileira, pela primeira vez aparece explicitamente a redução do uso de gás, petróleo e carvão. Isso lhe preocupa?
Não, porque já sabemos que esse movimento vai acontecer. O petróleo e o gás natural serão usados cada vez de maneira mais nobre, para fins diferentes do que se usa hoje. O mundo, a civilização ocidental, se viciou no petróleo como modelo de desenvolvimento. Agora, há a entrada de outras formas de energia mais sustentáveis. O petróleo vai continuar ainda tendendo um nicho, basicamente industrial. A petroquímica vai continuar ainda muito dependente do petróleo e gás, né, e para certos usos específicos como fonte de energia muito confiável.