O 27 de janeiro, Dia Internacional em Memória às Vítimas do Holocausto, não deveria ser lembrado apenas por judeus que sentiram na alma o extermínio. Deveria ser lembrado por cada ser humano.
A guerra entre Israel e Hamas, iniciada após o massacre perpetrado pelo Hamas em 7 de outubro, aumentou o antissemitismo no mundo em geral e no Brasil em particular. São vários os casos de ataques a judeus: em Detroit, nos Estados Unidos, a presidente de uma congregação judaica foi encontrada morta a facadas do lado de fora de casa; em Berlim, na Alemanha, uma sinagoga na região central foi alvo de coquetéis molotov.
No Brasil, manifestações violentas contra judeus aumentaram quase 1.000% após o início da guerra, segundo dados da Confederação Israelita do Brasil (Conib). Mas, antes mesmo daquela tragédia, o fenômeno já vinha sendo captado por organizações judaicas.
Esses ataques congregam a extrema direita com viés fascista e a extrema esquerda e sua dificuldade em condenar o terrorismo do Hamas - e capacidade de proferir discursos antissemitas travestidos de linguagem anti-imperialista.
O antissemitismo hoje não se manifesta apenas em ações concretas, mas em declarações no ambiente sem lei das redes sociais, o que indica a necessidade de acordos com empresas de mídias sociais, em geral resistentes a restringir discursos de ódio, para banir expressões desse tipo de suas plataformas.
Além de coibir falas racistas, é preciso separar contextos: a guerra entre Israel e o Hamas é uma coisa, o antissemitismo, um fenômeno que sempre acompanhou a humanidade, é outra. É também perfeitamente possível criticar o governo de Israel e suas ações em Gaza sem ser antissemita. É, ainda, viável condenar o terrorismo do Hamas e defender o direito dos palestinos a seu Estado independente e soberano. Colocar tudo no mesmo amalgama cinzento dos discursos superficiais significa repetir o que faziam políticos da Alemanha nazista, que, à época, acusaram falsamente os judeus de serem os causadores de todos os problemas sociais, econômicos, políticos e culturais.
Em 2016, quando o dicionário de Oxford elegeu "pós-verdade" a palavra do ano, sabíamos que seríamos, como humanidade, desafiados a revisitar cada vez mais conceitos para que não sejam esquecidos. Ser antissemita é ser racista. É como ser anti-palestino, islamofóbico, anti-gay, contra negros, anti-humanidade.
Como o próprio dicionário explicou naquele ano, vivemos tempos em que fatos objetivos são menos influenciadores na formação da opinião pública do que os apelos à emoção ou à crença pessoal. A atual relativização geral e irrestrita de fatos lembra muito os anos 1920 do século passado: polarização, ressentimentos, ódios e culpabilização de minorias que levaram à solução final. Por isso, é tão necessário lembrar - mais do que para não esquecer. Mas para que não se repita. O "nunca mais" não deveria ser só dos judeus. Mas de todos nós.