A solução para tragédia que se abate sobre o Oriente Médio passa, necessariamente, por reforçar vozes moderadas e isolar radicais. Mas não é simples. Do lado palestino, a Fatah, partido político moderado que comanda a Autoridade Nacional Palestina (ANP), sofre de uma grave crise de legitimidade cuja origem remonta à guerra fratricida que travou com o Hamas, em 2006.
Naquele ano, o grupo terrorista havia vencido a eleição para o Conselho Nacional Palestino, o parlamento. Israel e União Europeia (UE), que financiam em parte a ANP, não aceitaram o resultado. Tampouco a Fatah. Teve início a "Batalha de Gaza", uma guerra civil que durou quase um ano e terminou com a expulsão do partido moderado da Faixa de Gaza e a vitória militar do Hamas.
O enclausuramento dos fanáticos religiosos no naco de terra densamente povoado tornou a população de Gaza refém do Hamas. Enquanto isso, a Fatah, laica, foi perdendo, pouco a pouco, voz como representante dos palestinos. São vários os motivos: as elites árabes, que por décadas apoiaram a causa palestina, se cansaram e decidiram investir esforços em seus próprios problemas nacionais; a ANP uma organização burocrática por vezes se perdeu em escândalos de corrupção; Mahmoud Abbas, seu presidente de 87 anos, nunca foi um Yasser Arafat em termos de popularidade. Não tem seu carisma e muito menos seu tino político.
Abbas está há 20 anos no poder e não escolheu um grande nome como sucessor. Um movimento que não se renova tende a morrer. Seu centralismo é também motor da fraqueza de legitimidade.
Em 30 anos desde os Acordos de Oslo, a ANP, que deveria ser uma instituição transitória, tornou-se perpétua, um arremedo de governo de um Estado que nunca existiu. Perdeu confiança, porque não conseguiu melhorar a vida dos palestinos, decepcionados com a inação diante da dura vida na Cisjordânia, onde cerca de 11% do território geograficamente não contíguo, conhecido como Área A, está sujeito a incursões israelenses. A Área B (28%) está sob controle militar israelense-palestino e civil palestino; e a Área C (61%) está subordinada ao controle total de Israel.
Traumatizada pelos resultados de 2006 em Gaza, a ANP não realiza eleições desde aquele ano. Abbas, que só rompeu o silêncio oito dias depois dos ataques de 7 de outubro de 2023, disse:
— As ações do grupo não representam o povo palestino.
Mas, afinal, quem o representa? Segundo uma pesquisa do Jerusalem Media and Communication Center (JCMM), apoiada pela fundação alemã Friedrich Ebert, em julho do ano passado, 70% dos palestinos apoiavam a realização de novas eleições. Os dados mostravam que, se elas ocorressem, 51% diziam votar na Fatah, e 21% no Hamas. Ao mesmo tempo, 63% viam a ANP de forma negativa, cuja existência só atenderia aos interesses de Israel. Desde então, a insatisfação só tem aumentado. No ciclo sem fim de violência do Oriente Médio, desolação, miséria e humilhação costumam também ser combustível para o terrorismo.