Só Lula e seu círculo palaciano acredita que o mundo está preocupado com o que o presidente pensa ou diz sobre a guerra na Ucrânia - a menos, claro, quando o chefe da nação comete erros imperdoáveis como culpabilizar a vítima.
O que o mundo quer, realmente, saber do Brasil é sua agenda ambiental e climática. É nisso que somos grandes. É esse o maior capital geopolítico do país.
Embora a imprensa internacional ainda não tenha acordado para o escândalo em gestação no Planalto Central a partir do possível esvaziamento dos ministérios do Meio Ambiente e dos Povos Indígenas, o tema tem potencial para arruinar acordos e prejudicar, ainda mais, a imagem do Brasil no Exterior.
A jogada política do centrão, apoiada por ex-membros do governo de Jair Bolsonaro e pela bancada ruralista, é difícil de ser captada pelos olhos internacionais - e suas nuances são, claro, menos midiáticas do que as imagens da Floresta Amazônica e do Pantanal em chamas que estamparam capas de jornais globais em 2021. Mas o resultado é arrasador para a agenda do Planalto, pode inviabilizar o cumprimento das promessas de campanha de Lula e tornar inócuas as milhas de voo acumuladas por Lula em viagens internacionais nesses quase cinco meses de governo em busca de mostrar ao mundo que "O Brasil voltou".
Ainda na transição de governo, Lula, em sua primeira viagem ao Exterior como eleito, foi a Sharm el-Sheik, no Egito, participar da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas para mostrar que, ao contrário da não política ambiental de Bolsonaro, ele faria do Brasil um líder global no tema. Levou junto Marina Silva para desfilar pela COP no deserto, pegando carona no respeito e admiração com que ela é recebida nos fóruns internacionais. Tempo depois, seu anúncio como ministra do Meio Ambiente teve repercussão imediata na mídia global.
No caso de Sônia Guajajara, sua cerimônia de posse foi a mais simbólica, com indígenas cantando no salão nobre do Planalto - mais um gol no protagonismo ambiental do Brasil no cenário internacional.
A reação rápida do governo diante das cenas dantescas dos indígenas yanomamis, nos primeiros dias de governo, estancou uma crise que, embora não fosse culpa do novo governo, tinha potencial para rivalizar, em termos de impacto negativo, com as matas em chamas de Bolsonaro.
Mas Sônia e Marina não podem ficar como bibelôs do Planalto, servindo apenas como atração na vitrine ambiental.
Se vencer a queda de braço, o Congresso retirará a competência sobre demarcação de terras indígenas do âmbito da pasta de Sonia. A Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) e a Política Nacional de Recursos Hídricos passarão das mãos de Marina para a de Waldez Góes (apadrinhado por Davi Alcolumbre, do União Brasil), titular da Integração e Desenvolvimento Regional. O Cadastro Ambiental Rural (CAR) deixa o Meio Ambiente e vai para Gestão e Inovação em Serviços Públicos, de Esther Dweck.
Sem poder de caneta para Marina e Sonia, de quase nada adiantam horas de conversas entre Lula e Joe Biden no Salão Oval da Casa Branca em busca de recursos para o Fundo Amazônia. São quase inertes as trocas de telefonemas entre o brasileiro e Emmanuel Macron - aliás, o francês tem poder de dizer sim ou não e malograr o acordo Mercosul-União Europeia. Nem dezenas de ações em redes sociais e propaganda institucional.
Lula, que está refém do Congresso neste momento, precisa virar o jogo, sob pena de perder Marina e Sonia e, junto com elas, ver naufragar sua ambição de ser protagonista internacional e, pior, passar a ideia de que, apesar do verniz de futuro país da sustentabilidade, o Brasil continua sendo a nação do onde passa boi, passa boiada.