Eu poderia usar o termo "nova crise" no título. Mas, no fundo, a dissolução do parlamento pelo presidente Pedro Castillo e sua dissolução são um capítulo a mais da velha crise peruana. Não é de hoje. Não é de um ano atrás.
Nos últimos seis anos, o país sul-americano vive uma grave fragilidade institucional, que colocou para correr da Casa de Pizarro seis presidentes.
De diferentes formas, mas todos "hermanados" por suspeitas de corrupção, saíram Martín Vizcarra, Pedro Paulo Kuczynsky, Ollanta Humala, Alejandro Toledo e Alan García - esse último, se suicidou quando a polícia chegava a sua casa para prendê-lo. Toledo vive foragido nos Estados Unidos.
A explicação para tamanha instabilidade passa por vários fatores. O primeiro a fragilidade das instituições no Peru, que não suportaram uma das mais disputadas eleições da história. O pleito do qual Castillo foi o vencedor só teve resultado divulgado após 40 dias de idas e vindas judiciais e alegações de fraudes sem provas. O segundo fator, uma descrença total e irrestrita à classe política, que sofreu uma devassa na Lava-Jato peruana. O próprio voto em Castillo, um professor rural que nunca teve cargo Executivo, foi de rejeição aos políticos tradicionais. Foi o voto de punição no setor conservador, da elite de Lima.
Terceiro fator: uma herança maldita de Alberto Fujimori, que além de ter dado um auto-golpe, em 1992, mudou a Constituição acabando com o Congresso bicameral - no Peru, não há Senado. Ou seja, não se tem uma instância revisora - o que facilita a ação autoritária por parte do Lesgislativo e, eventualmente, reações autoritárias, como a de Castillo, ao decretar estado de exceção, toque de recolher e a dissolução do Congresso.
O tradicional mecanismo de check and balances (freios e contrapesos) da democracia fica prejudicado.
O Peru tem um processo singular que permite ao presidente dissolver o Congresso - isso não é possível no Brasil, por exemplo. Mas essa "permissão" também costuma ser usada como demonstração de força pelo Executivo, que normalmente acaba voltando, em efeito bumerangue. E costuma terminar com a queda do presidente. Castillo tomou essa decisão após sobreviver a duas tentativas de impeachment em pouco mais de um ano - a atual e que levou a sua derrocada foi a terceira.
Além disso, como um ingrediente a mais na triste história recente peruana, que devolve a América Latina aos anos 1970 do século 20, o país foi líder global de mortes pela covid-19 na proporção da população. Desigualdade social, desemprego, inflação alta, forte polarização, sem instituições fortes, têm derrubado chefes de governo mundo afora.