O resultado da eleição de domingo (21) na Venezuela é o de menos. O partido de Nicolás Maduro deve vencer na maioria dos 23 Estados e 335 prefeituras disputadas no pleito regional.
O que importa são dois fatos novos. O primeiro, o retorno dos observadores internacionais ao país, pela primeira vez desde 2006, quando Hugo Chávez os colocou para correr. Desta vez, participaram inspetores da União Europa (UE), das Nações Unidas e do Centro Carter, fundado pelo ex-presidente dos Estados Unidos Jimmy Carter.
A entrada dos funcionários no território foi permitida pelo governo como mostra de boa vontade. A estratégia é que, ao atestarem a lisura do pleito, os relatórios dos observadores reabram as portas do mundo à Venezuela, com o levantamento de sanções econômicas.
Isso até pode ocorrer, mas não será de uma hora para a outra - nem tão rápido quanto seria necessário para aplacar a fome de milhares de venezuelanos nem para retirar a economia da UTI. Atestados positivos de transparência do pleito, no entanto, ao menos já poderiam ajudar a liberar a venda de petróleo venezuelano para os Estados Unidos, por exemplo. O que não é pouco.
O segundo fato novo é talvez mais concreto e permite vislumbrar o Estado das coisas no país onde a democracia morreu em 2015 - a última eleição reconhecida internacionalmente. Depois daquele pleito, o regime enjambrou uma votação para uma Assembleia Constituinte que reduziu o poder da Assembleia Nacional, o Poder Legislativo de direito. Foi a pá de cal no último dos poderes do Estado ainda com algum grau de autonomia. Executivo e Judiciário já estavam nas mãos do chavismo-madurismo, sem falar na imprensa independente, que respirava por aparelhos havia pelo menos 15 anos.
Na eleição deste domingo (21), pela primeira vez a oposição participou, depois do boicote de dois pleitos - o presidencial de 2018 e o legislativo de 2020.
E aqui, um parênteses: sim, o regime é responsável por ter apertado o torniquete da democracia venezuelana, mas a oposição tem sua parcela de culpa. Ao se abster de participar das disputas eleitorais sob o argumento de que os processos eram fraudados, ela escancarou as portas para a ditadura. Facilitou as coisas, digamos assim.
A oposição está fragmentada em ao menos três forças - a representada por Juan Guaidó, que se lançou em uma aventura política de alto risco, em 2019, ao se autoproclamar presidente do país; a de Henrique Capriles, ex-candidato à presidência, que vivia no exílio, e voltou ao país para disputar o governo de um Estado, e de Maria Corina Machado, a voz mais radical na atualidade contra Maduro.
Guaidó não votou, mas desta vez também não fez campanha para que a população boicotasse o pleito - o que dá mostras de que sua "revolução" está perto do fim. Hoje, segundo o Instituto Datanálisis, apenas 15% dos venezuelanos o apoiam - em 2019, eram 63%.
Ainda que seja reconhecido como o presidente do país por muitos governos, como o brasileiro, Guaidó nunca chegou ao Palácio de Miraflores e seu "mandato" é cada vez mais questionado pelos próprios companheiros - a ponto de muitos proporem como o fim da tentativa tomada do poder no início do ano que vem.
Capriles é o maior defensor de que a oposição precisa lutar, no voto, para desbancar Maduro. Isso significa ir abocanhando espaços nas eleições regionais, como a de domingo (21). É uma caminhada longa, porque o chavismo-madurismo, nessas mais de duas décadas de poder, se espraiou por todos os níveis da sociedade.
Maria Corina, por sua vez, segue defendendo que qualquer participação política significa ser cúmplice com o regime. Ela defende a continuidade da luta para derrubar o governo à fórceps.
Ao menos, dessa vez a oposição participou da eleição. Mas, se chegar a 2024 da forma como chegou ao domingo (21) - diluída, fragmentada e em disputas fratricidas -, a oposição de novo irá morrer na praia, como Guaidó. E poderemos esperar a continuidade de Maduro no poder por, ao menos, mais seis longos anos.