Na mesma semana em que o mundo lembra, no sábado (11), o aniversário de 20 anos dos atentados de 11 de setembro de 2001 nos Estados Unidos, tem início, em Paris, o julgamento dos acusados do maior ataque terrorista em solo francês. A noite de horror de 13 de novembro de 2015 começou no Stade de France, em Saint-Denis, estendeu-se por bares e cafés dos arredores da Place de la République, em Paris, e culminou na casa de espetáculos Bataclan. Seis anos depois, 14 homens sentam-se no banco dos réus pela morte de 130 pessoas – outros seis são julgados à revelia.
Todos os olhos estão voltados para o franco-marroquino Salah Abdeslam, o único dos integrantes do comando suicida que ainda está vivo. Até hoje sua participação na ação não é clara. O julgamento, que deve durar nove meses, será uma oportunidade
para que detalhes de seu envolvimento venha a público.
Nos dias seguintes aos atentados, a suspeita era de que ele teria sido o motorista que conduzira o grupo de nove extremistas até Paris. Depois surgira a versão segundo a qual ele teria desistido de praticar pessoalmente os ataques e voltado a Bruxelas, onde morava. Com o tempo, a conexão com o grupo que explodiu, no ano seguinte, o aeroporto e o metrô da capital belga (32 mortos), evidenciou a existência de uma célula extremista no eixo Paris-Bruxelas.
Nesta quarta-feira (8), na abertura do julgamento, Abdeslam mostrou-se desafiante ao ser questionado pelo juiz sobre sua profissão, uma pergunta protocolar.
– Deixei tudo para me tornar um combatente do Estado Islâmico – afirmou.
Antes, dissera:
– Em primeiro lugar, quero dizer que não há outro Deus além de Alá e que Maomé é seu profeta. Agora, julguem-me, façam o que quiser de mim. Não tenho medo de vocês, coloco minha confiança em Alá e isso é tudo, não tenho nada a acrescentar.
Há uma ponte entre Nova York, palco principal dos atentados de 11 de setembro de 2001, e Paris, local dos ataques de 13 de novembro de 2015. A extensão da Guerra ao Terror dos Estados Unidos do Afeganistão para o Iraque, a queda de Saddam Hussein e o vácuo que se seguiu transformaram o país do Oriente Médio em um imã para terroristas, que originaram o Estado Islâmico (EI), um grupo ainda mais cruel do que a rede Al-Qaeda, que havia atacado Nova York e Washington. A Europa se tornou o campo de batalha de voluntários suicidas enviados pelo califado ou que surgiram nas entranhas de suas periferias, em geral por conta de pobreza, desemprego e desilusão que alimentam as veias do jihadismo. Como Paris, houve antes as bombas em Madri e Londres. Depois, houve Bruxelas, Nice, Berlim, Barcelona, Estrasburgo, Manchester, Estocolmo e outros horrores. O modus operandi dos extremistas foi migrando de homens-bomba a lobos solitários, com ligações cada vez mais difusas com o EI, a atropelar e esfaquear civis em vias públicas.
Este será o “julgamento do século”, nas palavras da imprensa francesa, embora, infelizmente, não se possa dizer que o mundo em geral e a Europa em particular estejam livres de novos atentados terroristas “nesse século” que está apenas no início de sua terceira década.