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Nesta quarta-feira (29), o serviço de imprensa do governo da Alemanha informou que a chanceler Angela Merkel parabenizou Olaf Scholz pela vitória nas eleições de domingo (26).
Isso significa três coisas. A primeira - e mais óbvia: Scholz será o futuro chanceler. Os sociais-democratas voltam ao poder da maior economia europeia pela primeira vez desde 2005, quando Gerhard Schröder ocupou o posto.
A segunda - e dependente da primeira -, Armin Laschet, o candidato de Merkel, fica desautorizado pela chefe, mesmo que a CDU represente a segunda força política da Alemanha, a tentar disputar, na mesa de negociação, o governo em uma eventual coalizão como a que está no poder. Na prática, os conservadores, que hoje lideram a aliança de governo com Merkel, jogaram a toalha. E, mais do que isso, provavelmente passarão para a oposição.
A terceira leitura exige retirar a lente de sobre Berlim e ampliar para a União Europeia (UE). A vitória do Partido Social-Democrata (SPD) na Alemanha representa o retorno do protagonismo dessa força política ao cenário europeu, depois de anos em que muitos analistas consideraram a social-democracia na lona - ou, na melhor das hipóteses, sob hibernação.
A se confirmar a previsão de que Scholz será o futuro chanceler, os sociais-democratas somarão a liderança de sete nações do bloco econômico - além de Alemanha, governam Espanha, Suécia, Portugal, Malta, Dinamarca e Finlândia. Em outros quatro, além da própria Alemanha, eles compõem alianças hoje no poder - na Bélgica, em Luxemburgo e na República Tcheca.
A UE é filha dileta da social-democracia europeia pós-Guerra Fria. Logo, não é difícil concluir que o bloco tem tudo para ser fortalecido com Scholz no poder. Essa sensação de retorno aos anos de glória dos europeístas é reforçada no momento em que o Reino Unido exibe ao mundo a primeira fotografia - que não é boa - da era pós-Brexit: falta de produtos nas prateleiras dos supermercados e de combustíveis nos postos pelo déficit de mão de obra de caminhoneiros britânicos. Sim, o Reino Unido dependia - e depende - de trabalhadores oriundos do outro lado do Canal da Mancha para manter rodando sua economia. E sim, o Brexit, rompeu com esse equilíbrio.
Com Scholz na chancelaria alemã, pode-se esperar o endurecimento de posições com o Reino Unido, moderação com a China e uma agenda em que as dimensões sociais e ecológicas terão prioridade - ainda maior, em uma provável coalizão com os Verdes.
Isso nos remete a uma outra reflexão: a vitória da "política normal" na Alemanha, que escanteou a extrema-direita representada pela xenófoba Alternativa para a Alemanha (AfD), significa relações tensas com Hungria, de Viktor Orbán, Polônia, do Partido Lei e Justiça (PiS), e Brasil de Jair Bolsonaro.
À CDU, de Merkel, que perdeu, apesar da altíssima popularidade da chanceler, resta o divã. Nesse período de intensa reflexão sobre o futuro, o primeiro desafio da direita tradicional (e Merkel aposentada terá lições importantes a dar) talvez seja não se tornar refém do populismo, como ocorreu com o Partido Republicano nos Estados Unidos ou, ali do lado, com os vizinhos da Ilha de Sua Majestade.