Donald Trump enfrenta duas crises paralelas - a maior revolta racial da história recente e a devastação da pandemia, que faz dos Estados Unidos o país com maior número de infectados e mortos pelo coronavírus no planeta. Mas é cedo para certezas sobre o impacto da dupla tempestade na eleição de novembro. Há argumentos para os dois lados.
No cenário que mais preocupa os republicanos, além da fúria das ruas e da pandemia, o componente econômico pode pesar contra os planos de reeleição de Trump. Até a chegada do coronavírus, os Estados Unidos tinham o melhor desempenho em anos - inflação e desemprego baixos e alto crescimento da economia.
Com a pandemia, essa narrativa, que toca fundo do eleitor comum, preocupado com o bolso, foi por água baixo. Hoje, Trump carrega o peso de 40 milhões de desempregados. O presidente, que já não tem a simpatia do voto negro e hispânico, fundamentais para mantê-lo na Casa Branca, enfrentará em novembro o tribunal da opinião pública em geral, que julgará sua atuação durante o maior desafio do governo desde os atentados de 11 de setembro de 2001. Sua demora em reagir, a negação de fatos científicos e a minimização da gravidade da covid-19 jogam contra. Nesse cenário, a pandemia derrota Trump.
Mas há também argumentos para pensar que nem tudo pode ser ruim no campo republicano. Ao falar duro contra os manifestantes, peitar governadores, quase chamando-os de frouxos diante da crise, e se autoproclamar o presidente da lei e da ordem, ele cativa seu eleitorado: o homem branco, conservador, heterossexual que vê, como Trump, a fúria dos protestos como arruaça. Ao falar em enviar o exército para "dominar as ruas" repete a estratégia da campanha de 2016 contra Hillary Clinton, para se beneficiar nos Estados decisivos, ou pêndulos, os chamados “swing states”, aqueles que ora votam nos democratas, ora votam nos republicanos. Trump também leva vantagem porque, como o voto não é obrigatório, não há garantias de que o manifestante que exige punição aos policiais que assassinaram o negro George Floyd irá, de fato, transformar sua revolta em posicionamento anti-Trump na urna. No último mandato de Barack Obama, a voz dos negros ecoou nas ruas em protestos em cidades como Ferguson, Baltimore, Nova York e Charlotte contra a violência policial - e nem isso foi suficiente para dar a vitória aos democratas.
O eleitor americano, sabe-se, não sai para votar a menos que o candidato tenha uma agenda - ou um discurso - que o mobilize. Joe Biden acordou para essa necessidade e tem tentado mostrar aos manifestantes (com o apoio de Obama) que tem uma política que dialoga com as exigências dos manifestantes.
Segundo o site de pesquisas Real Clear Politics, que reúne as médias das pesquisas nacionais já no período das manifestações raciais, o democrata segue na frente, com 49,9% dos votos, contra 42,1% de Trump.