Em campos ideológicos opostos, os governos de dois vizinhos nossos, Chile e Argentina, recorrem a decisões semelhantes: a suspensão das demissões de trabalhadores como forma de tentar limitar o impacto econômico e social provocado pela pandemia da covid-19.
O coronavírus chegou aos dois países em momento de instabilidade: o Chile enfrentou no segundo semestre de 2019 os maiores protestos desde a redemocratização do país, nos anos 1980, com quebra-quebra nas ruas, pressão social, um modelo neoliberal em xeque que levou o presidente Sebastián Piñera e boa parte da classe política a rediscutir os fundamentos da nação. Várias medidas foram implementadas em resposta ao clamor das ruas, mas uma das principais, o plebiscito que estava previsto para este mês, em que os chilenos decidiriam sobre uma nova Constituição - a atual é do tempo da ditadura de Augusto Pinochet -, foi adiado em função da pandemia.
A Argentina, por sua vez, vivia nos tempos pré-coronavírus uma crise econômica que elevou o contingente de pobres de 29% para 35% da população, durante o governo Mauricio Macri, e que resultou, em outubro, no retorno do kirchnerismo à Casa Rosada.
O Chile da direita de Piñera e a Argentina da esquerda de Alberto Fernández recorrem a soluções emergenciais parecidas. O governo argentino decretou ontem a proibição de demissões sem justa causa por 60 dias. Também estão vetadas as suspensões dos contratos dos funcionários por falta ou redução de carga de trabalho. Segundo o mais recente boletim epidemiológico, o país tem mil infectados pelo coronavírus e 27 mortes. Apenas 40% da economia argentina segue ativa devido à paralisação dos serviços não essenciais. Os setores que ainda funcionam são os do agronegócios, produção e comercialização de alimentos e medicamentos, combustíveis, geração e distribuição de luz, água e gás, além da administração pública.
Do outro lado da Cordilheira dos Andes, o Chile entrou, em 18 de março, em estado de exceção constitucional por 90 dias. O Congresso aprovou um projeto de lei que garante a proteção aos empregos, enquanto durar o estado de calamidade pública. Como na Argentina, estão suspensas as demissões. Porém, a medida chilena é um pouco mais conservadora. Permite aos empresários redução ou suspensão temporária de salários. Em caso de suspensão do contrato, o seguro-desemprego cobrirá, no primeiro mês, 70% do salário do trabalhador. No mês seguinte, a cobertura cai para 55%, e, no terceiro, para 45%. O país tem até agora 2,7 mil infectados, e 12 mortes.