A família real britânica, que nesta segunda-feira ganhou um novo rebento, o filho de Harry e Meghan, é uma instituição que guarda elementos antidemocráticos, privilégios medievais e tradições preconceituosas. Um exemplo: ainda que a rainha Elizabeth II tenha reformado a lei de sucessão, em 2011, acabando com a determinação de gênero para ascender ao trono, títulos de nobreza continuam a favorecer os homens.
É também uma instituição cara: segundo estimativas, o Estado britânico gastou R$ 1,7 bilhão para manter a corte em 2018, colocando na conta somente o valor do Sovereign Grant, subsídio concedido para financiar atividades oficiais. Em média, cada britânico tira do bolso, a cada mês, cerca de R$ 3,50 em impostos para manutenção da coroa.
Mesmo assim, nada, nem gastos bilionários nem tradições arcaicas, tornam a monarquia questionada pela maioria da população. Segundo pesquisas, apenas 19% dos britânicos acham que o país deveria acabar com os privilégios da nobreza. Fora das fronteiras do reino,estudo realizado no ano passado pela Ipsos Mori em 28 países mostrou que a realeza é bem vista: 35%, em média, com destaque para Romênia, Arábia Saudita, Índia e Estados Unidos, os que mais a cultuam. Só 11% dos entrevistados se disseram desfavoráveis, no total.
O nascimento do bebê, nesta segunda-feira, é o ato contínuo do episódio midiático do casamento de Harry e Meghan, em maio do no ano passado, o maior evento televisivo no Reino Unido desde a abertura das Olimpíadas de Londres, em 2012.
Do ponto de vista político, a realeza está blindada, por exemplo, da crise do Brexit, o imbróglio com a União Europeia que se transformou em novela para a primeira-ministra Theresa May. O drama que o Reino Unido respira há quase três anos sequer respinga sobre a rainha Elizabeth II e seus membros.
Por que, no momento em que outras instituições – partidos políticos, Igreja, sindicatos, imprensa, Judiciário, Legislativo, governos – balançam, a realeza continua sólida? Por que, entre 28 monarquias atuais no mundo, é a britânica que desperta mais interesse?
Alguns dos elementos que explicam o fascínio pelos romances, casamentos, doenças e mortes que envolvem os moradores de Buckingham são semelhantes àqueles que fazem com que nos identifiquemos com séries de TV: um pouco de empatia, um tanto de curiosidade, com boas doses de voyeurismo. Um misto de sonho — conto de fadas de príncipes, princesas e castelos enraizados na cultura ocidental — e a sensação de identificação, gente como a gente, uma realeza de carne e osso.
Com relação ao comportamento da família real pode-se perceber o antes e o depois da morte da princesa Diana, drama com requintes bizarros — como as famosas taras públicas de príncipe Charles no affair com Camilla Parker-Bowles — que amalgamou o mundo. Havia detalhes de espionagem, teorias da conspiração, além da tragédia familiar propriamente dita.
Possivelmente ao custo de milhões, a realeza aprendeu com os marqueteiros que contratou. A família adaptou-se às mudanças comportamentais do século 21. A própria rainha Elizabeth II, vista como megera à época do casamento entre Charles e Diana, passou exibir, de uns anos para cá, perfil mais humano, a vovozinha que muitos gostariam de ter.
Todo o suposto glamour da monarquia ajuda a levar milhões de turistas ao reino de Sua Majestade, aumentando a arrecadação de impostos todo os anos. Além do turismo, a família real influencia a moda e o entretenimento. Mais do que elementos de uma novela ou série, além até do que um Big Brother da vida real — com o perdão do trocadilho —, a família real é business.