As relações estão estremecidas entre a Casa Branca e o Congresso depois do mais longo shutdown da história dos Estados Unidos. Logo, o clima esta noite em Washington (0h pelo horário de Brasília) será de constrangimento no discurso sobre o Estado da União, o pronunciamento anual do presidente americano perante as duas Casas do parlamento.
Mesmo assim, Donald Trump promete uma fala otimista. Nela, o presidente prestará esclarecimentos a parlamentares, militares e membros da Suprema Corte sobre a atual situação dos EUA e os planos para 2019. É como um mapa do caminho.
A coluna sugere cinco pontos sobre os quais devemos prestar atenção:
1) O fantasma do shutdown
Trump terá a suas costas, pela primeira vez, uma speaker (como os americanos chamam a presidente da Câmara) adversária. Nancy Pelosi, a toda-poderosa dama democrata, chegou a desaconselhar Trump a fazer o discurso durante o shutdown — a fala estava marcada para 29 de janeiro. O presidente assentiu.
Um acordo frágil pôs fim a 35 dias de paralisação por conta do impasse entre o governo republicano e a oposição democrata. Trump queria verba para construir o muro na fronteira com o México. A oposição condicionava a aprovação do orçamento para 2019 ao recuo do Executivo. O tema foi resolvido provisoriamente sob a garantia de que os dois lados continuarão negociando. A questão foi destravada, mas o shutdown continua pairando sobre o Capitólio e a Casa Branca.
2) O polêmico muro
Por falar em muro, o discurso de Trump esta noite deve ser marcado pelo tema imigração. Ele usará o espaço para, entre outras questões, defender os US$ 5,7 bilhões que deseja para erguer a barreira na fronteira com o México. Caso o Congresso não libere esse montante, o presidente ameaça declarar estado de emergência nacional — o que, por outros meios, lhe garantiria o dinheiro.
Os convidados pelo governo para estar no Capitólio esta noite também passam uma mensagem, reforçando a palavra do presidente, que deve citá-los um a um. Neste ano, estarão na plateia um representante dos funcionários da patrulha na fronteira, um policial vítima de overdose acidental durante operação de apreensão de drogas e familiares de pessoas assassinadas por imigrantes.
Além desses visitantes, estarão lá a viúva de um militar morto no Afeganistão — de onde Trump planeja retirar tropas —, e a prêmio Nobel da Paz 2018, Nadia Murad, ativista yazidi dos direitos humanos e sobrevivente do grupo terrorista Estado Islâmico.
3) Tensão com a China
A tensão comercial com a China deve ser destacada no pronunciamento. O gigante asiático abriu em 28 de janeiro processo legal na Organização Mundial do Comércio (OMC) contra tarifas americanas impostas sobre US$ 234 bilhões em exportações. Ainda sobre o Extremo Oriente, Trump deve reforçar sua intenção de voltar a se encontrar com o ditador norte-coreano, Kim Jong-un. Este é um dos pontos que o governo deve celebrar durante o discurso.
4) Economia em alta
O outro ponto a ser comemorado é a economia. O presidente deve surfar nos bons números, em especial os do desemprego. Foram criados 304 mil postos de trabalho em janeiro, acima da previsão de 170 mil. Trump tem dito que a economia do país "nunca esteve tão bem".
Por outro lado, analistas apontam sinais de desaceleração no horizonte. Há quem fale até em risco de recessão.
5) Crise na Venezuela
A tensão social, econômica e política na Venezuela deve estar no discurso de Trump. É tradição o presidente mencionar temas de política externa. Desde que chancelou o presidente da Assembleia Nacional do país latino-americano, Juan Guaidó, como chefe de Estado, no dia 23 de janeiro, o americano tem afirmado que "todas as opções estão sobre a mesa" — essa frase é clássica do glossário dos chefes de Estado dos EUA para dizer que uma ação militar não está descartada. Como forma de apoio ao governo paralelo — e de rejeição a Maduro —, um representante de Guaidó estará no Capitólio: o encarregado diplomático de negócios da Venezuela nos EUA, Carlos Vecchio.