O futuro ministro de Minas e Energia do governo de Jair Bolsonaro, almirante-de-esquadra Bento Costa Lima Leite de Albuquerque Jr., exerce o papel de catequizador da opinião pública sobre a importância de o Brasil dominar a energia nuclear, assunto delicado do ponto de vista de segurança e estratégia internacional, nem sempre visto com bons olhos internamente e no Exterior.
Como diretor-geral de Desenvolvimento Nuclear e Tecnológico da Marinha, o militar viajou nos últimos meses país afora em busca de sensibilizar empresários, políticos e pesquisadores sobre os programas.
Conhecido nos meandros da Marinha como almirante Bento, ele é um dos defensores do conceito da "Amazônia Azul", território marítimo brasileiro onde está a zona econômica exclusiva do Brasil. Tratam-se de 3,6 milhões de quilômetros quadrados de água - área equivalente à superfície da Floresta Amazônica, daí o nome de batismo. Esse termo tem servido de justificativa do almirantado em sua cruzada por investimentos. Afinal, é nesta região que ficam as reservas do pré-sal.
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Todos os investimentos em defesa operam na casa dos milhões ou bilhões. A um custo estimado de R$ 32 bilhões, o Prosub (Programa de Desenvolvimento de Submarinos) é a menina dos olhos de Bento e da Armada brasileira. Ele prevê a construção de quatro submarinos convencionais, o primeiros deve ser lançado ao mar no próximo dia 14, e, objetivo principal, o acalentado submarino nuclear, com previsão para 2027. Outro programa associado prevê o desenvolvimento do primeiro reator atômico construído no país, que deve entrar em fase de testes em 2022.
Bento costuma se orgulhar do fato de o Brasil sera a única nação entre as grandes com tecnologia atômica e que usa esse tipo de pesquisa para "fins pacíficos". Diferentemente de equipamentos convencionais, movidos a diesel, o submarino nuclear não precisa subir à superfície para reabastecer de oxigênio. Isso dá maior autonomia, velocidade e o torna mais furtivo. O desenvolvimento da tecnologia também serve a fins civis: o reator multipropósito vai produzir radioisótopos para a fabricação de medicamentos usados no tratamento de doenças nas áreas de cardiologia, oncologia, hematologia e neurologia.
Em outubro, o almirante palestrou na sede do Comando do 5º Distrito Naval, em Rio Grande, e na Capitania Fluvial de Porto Alegre. Nessas ocasiões, admitiu que, embora com fins pacíficos, o desenvolvimento de tecnologia nuclear pelo Brasil é visto muitas vezes com desconfiança pela comunidade internacional.
— É lógico que determinados países não veem com bons olhos um outro estar entrando no negócio — afirmou à coluna em Porto Alegre.
É também nesses mares internacionais que ele tem atuado. Bento é o homem de confiança da Marinha ao lidar com outros governos e organismos globais, prestando garantias de transparência à Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), cujas inspeções com e sem avisos prévios são feitas com frequência.
Algumas questões se pode inferir sobre indicação de Bento para o cargo de ministro de Minas e Energia:
1) O Prosub, vilipendiado entre os anos 1990 e 2000 por cortes de orçamento e questões estratégicas, deve ser acelerado. Foram gastos de 2008 até agora R$ 16 bilhões — falta quantia semelhante.
2) Ao indicar um homem de assuntos nucleares para o posto, o governo Bolsonaro deve ganhar alguns pontos junto à comunidade internacional, em especial à ONU, ao apontar para investimentos em uma tecnologia de geração de energia simpática à parte dos cientistas, por não gerar gases que provocam o efeito estufa.
3) Porém, o contrato do Prosub traz a digital da era do PT no Planalto. O acordo com a França para a construção do submarino nuclear foi selado pelos ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Nicolás Sarkozy em 2008. O projeto estava no âmbito da estratégia do governo de tornar o Brasil um dos grandes jogadores do sistema internacional, mirando uma vaga permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas. No continente americano, o Brasil seria o único país além dos Estados Unidos a dominar a tecnologia. Um submarino com propulsão nuclear tem capacidade de submergir na costa do Atlântico e aparecer em qualquer outro lugar do mundo. Como a Casa Branca da era Donald Trump, com a qual Bolsonaro deseja alinhamento automático, vai reagir aos planos nucleares do grande vizinho do Sul é a grande questão estratégica que Bento terá de equilibrar. Seu mar mais turbulento a partir de agora.