Depois de semanas pesquisando sobre o assunto, já posso afirmar com alguma convicção: não é bom o projeto da prefeitura de conceder a Redenção à iniciativa privada. É possível, sim, adaptar a proposta e transformá-la em algo positivo para a cidade, mas, do jeito que está, o risco de dar errado é grande.
Primeiro, que fique claro, não sou contra a concessão de determinados espaços públicos. Tenho certeza, por exemplo, de que o Parque Maurício Sirotsky Sobrinho, o Harmonia, concedido a um grupo empresarial no ano passado, será um dos grandes sucessos de Porto Alegre quando estiver com as obras prontas, em 2026.
Só que o Harmonia precisa mesmo de um choque administrativo. Precisa de uma mudança de perfil que o poder público, sozinho, jamais conseguiria fazer. Porque aquele é um parque esvaziado, monótono: à exceção de setembro, quando ocorre o Acampamento Farroupilha, são raríssimos os atrativos e as opções de lazer que o Harmonia oferece.
Não é o caso da Redenção. A Redenção já tem uma lógica estabelecida, um funcionamento próprio que pode ser duramente afetado pela gestão de uma empresa privada. Refiro-me aos artistas de rua, às pequenas exposições, aos brechós, aos bate-papos culturais, às feirinhas de vinil – são manifestações que encantam os frequentadores justamente pelo caráter espontâneo e desregulamentado. Essa informalidade, aliás, é a própria cara da Redenção.
Em entrevista ao Perimetral Podcast, que apresento com o colega Léo Saballa Jr., a secretária municipal de Parcerias, Ana Pellini, confirmou que o administrador privado deverá impor, sim, cadastro prévio e outras regras para quem quiser se apresentar no parque.
– Mas acredito que isso não vá ser um impeditivo, porque, se (a manifestação artística ou cultural) for uma coisa bacana, isso só vai trazer público para o concessionário – avaliou ela.
A questão é que, neste caso, não pode ser papel do concessionário definir o que é "uma coisa bacana". Um rapaz desafinado que canta aos sábados à margem do espelho d'água, por exemplo, talvez seja inoportuno para um empresário ranheta – mas há quem enxergue na despretensão e no bom-humor do sujeito o verdadeiro espírito daquele ambiente.
O modelo ideal para a Redenção seria conceder alguns polígonos do parque, e não 100% da área.
Professor da Faculdade de Arquitetura da UFRGS, o urbanista Benamy Turkienicz entende que o modelo ideal para a Redenção seria conceder alguns polígonos do parque, e não 100% da área. Ou seja: a iniciativa privada passaria a administrar – e a faturar com – o parque de diversões, o pedalinho, o trenzinho, o centro gastronômico, os bares, as floriculturas e o estacionamento subterrâneo que a prefeitura tanto quer. Talvez algum outro ponto possa ser adicionado à concessão, mas nada que entregue ao concessionário o poder de deliberar sobre o comportamento no espaço público.
– E aí, como contrapartida à concessão desses polígonos, o grupo empresarial ficaria responsável pela manutenção do parque e pelos investimentos previstos no edital – explica Benamy.
É uma alternativa boa, factível e que deveria ser estudada. Porque, se a cidade perder o jeito, a cara, a identidade da Redenção, estará perdendo a própria Redenção.