A ótima reportagem de Alberi Neto e Bruna Vargas, apontando alternativas e soluções para o nosso moribundo transporte coletivo, confirma um célebre bordão: cidade desenvolvida não é onde pobre anda de carro, mas onde rico anda de ônibus.
Dizem que a frase é de Enrique Peñalosa, ex-prefeito de Bogotá. Ele ficou famoso por transformar a cidade em modelo internacional de mobilidade urbana com medidas, digamos, não muito simpáticas – embora todas, mais adiante, tenham se revelado corretas. Peñalosa restringiu, por exemplo, o estacionamento de carros em vias públicas.
O raciocínio era simples: se o cidadão compra uma geladeira e não tem onde guardá-la, o problema é dele – não pode achar que o poder público tem a obrigação de resolver uma dificuldade que ele criou para si próprio. Com os automóveis, não há por que ser diferente. Quem quiser tê-los, que encare o preço de um estacionamento privado ou deixe-os em casa para usar o transporte coletivo, como fazem milhões de pessoas todo dia.
Ao impedir que se estacione na rua, segundo Peñalosa, é possível aumentar em 40% a fluidez do trânsito sem gastar um centavo em obras de duplicação. O dinheiro, portanto, pode ser investido em um transporte público que atenda a todos com eficiência e conforto. Foi o que aconteceu.
Bogotá ganhou um elogiado sistema de faixas exclusivas – enquanto um carro levava uma hora e meia para atravessar a cidade, um ônibus passou a levar 30 minutos. A lógica de Peñalosa era inatacável: se um ônibus transporta 45 pessoas, e um carro transporta só uma, o primeiro merece ocupar 45 vezes mais espaço na via pública.
A partir daí, as coisas mudaram. Para chegar rápido ao destino, pessoas com mais dinheiro começaram a usar o transporte coletivo. E o pobre parou de sustentar o sistema sozinho – o que ainda ocorre em Porto Alegre. Porque aqui, você sabe, é impossível um morador da periferia andar de Uber. Esse é um luxo de quem vive nos bairros centrais, já que uma corrida do Rubem Berta até o Centro custa R$ 50.
Para inverter essa realidade, para os ônibus deixarem de ser "coisa de pobre", alguém vai perder em um primeiro momento. Em Bogotá, perderam os que estacionavam o carro na rua. Na capital gaúcha, uma espécie de pedágio para quem acessa a região central aguarda votação na Câmara. Tomara que passe.
Porque cidade desenvolvida, como diz Peñalosa, não é onde pobre anda de carro, mas onde rico anda de ônibus.