O homem que transformou a mobilidade urbana de Bogotá chega hoje a Porto Alegre para dividir experiências que envolvem transporte sustentável. Prefeito da capital colombiana de 1998 e 2001, Enrique Peñalosa, 57 anos, é dono de ideias polêmicas, como restringir a circulação de automóveis priorizando coletivos e bicicletas.
Para mostrar a importância de pedalar, o colombiano vai participar de um passeio ciclístico nas ruas da cidade amanhã e, na segunda-feira, será o palestrante do Fronteiras do Pensamento. Peñalosa é formado em História e Economia nos Estados Unidos e tem especialização em administração pública, mas prefere ser chamado de urbanista, ciclista e amante da natureza. Teve ideias que revolucionaram a cidade e serviram de exemplo para outras capitais. Todos os projetos partiram da criação de símbolos sociais que gerassem igualdade. Por isso, acredita que carros estacionados em calçadas refletem falta de democracia e que o metrô não é prioridade.
- O transporte público soluciona a mobilidade, não os engarrafamentos. Somente a restrição de automóveis é que fará isso. Podemos ter metrô e não será suficiente - disse Peñalosa, que hoje é presidente do Institute for Transportation and Development Policy (ITDP), organização não governamental norte- americana que presta assistência técnica no desenvolvimento de meios de transporte sustentáveis.
Em Bogotá,cidade onde ainda reside, se movimenta de bicicleta ou em transporte público diariamente para trabalhar. O urbanista comemora a adesão da população. Do final da década de 1990 até finalizar o seu mandato, o número de adeptos ao transporte passou de zero para 5% da população, o que representa 350 mil habitantes.
ENTREVISTA
O consultor, que está no Brasil desde quarta-feira para participar da Rio+20, no Rio de Janeiro, falou por telefone com a Zero Hora:
Zero Hora - Durante o seu mandato, de 1998 a 2001, o senhor ficou conhecido por revolucionar Bogotá. Conte como isso aconteceu.
Enrique Peñalosa - O espaço viário é um recurso mais valioso do que se encontrar petróleo e diamantes em uma cidade. Começamos a dar muito mais importância aos pedestres e aos ciclistas e para o transporte público. Fizemos ciclorutas, que não existiam. Priorizamos o investimento em espaço para ônibus, parques, colégios e melhorias em bairros suburbanos.
ZH - E como foi a aceitação dos seus projetos perante à população?
Peñalosa - Dar dinheiro para os pobres é positivo politicamente e necessário, mas não constrói igualdade. Mas quando se equipa os espaços públicos se constrói igualdade.
ZH - O senhor poderia citar alguns exemplos?
Peñalosa - Um metrô pode ser muito importante, mas não constrói igualdade, enquanto o símbolo de um ônibus, que vai por um caminho exclusivo em alta velocidade entre os automóveis que não se movem em um engarrafamento,constrói igualdade.
ZH - Havia verba pública para aplicar em mobilidade urbana?
Peñalosa - Sim, mas subimos os impostos, como o da gasolina. Elevamos a tarifa da água em zonas mais ricas. Também vinculamos as empresas privadas o máximo possível.
ZH - O senhor diz que o símbolo de falta de democracia é ter carros estacionados nas calçadas.Por quê?
Peñalosa - Os pedestres são os mais vulneráveis, mais pobres. Então, ter um carro em cima de uma calçada é uma falta de democracia e de respeito. Construímos muitas calçadas e tiramos muitos carros de cima delas, colocando cartazes com avisos nos postes e fiscalização.
ZH - Quais são os exemplos fundamentais para o desenvolvimento urbano de uma cidade?
Peñalosa - O que diferencia uma cidade atrasada de uma avançada não são os metrôs, nem as autopistas. É a qualidade das calçadas.
ZH - Conhece Porto Alegre? O que pensa sobre como estamos nos programando para a Copa?
Peñalosa - Gosto mais do sistema BRT do que do metrô. Seria interessante construir uma ciclovia e um parque linear na borda do rio (Guaíba).
PROJETOS
Investimento em parques - Implementou melhoras radicais no centro de Bogotá, como a recuperação da Praça de São Vitorino, tomada pelo crime e comércio ilegal, e o chamado bairro Cartucho, ponto de tráfico de drogas e prostituição que deu lugar ao Parque Tercer Milênio, de 23 hectares. Construiu e reconstruiu mais 1,1 mil parques e incentivou o plantio de mais de 100 mil árvores.
Transmilênio - Sistema de ônibus expressos, similar aos BRTs (Bus Rapid Transit) que funcionam em Curitiba e que devem ser implementados em Porto Alegre. Somam 25% dos sistema de ônibus de Bogotá.
Ciclovias - Havia ciclovias que podiam ser usadas apenas aos domingos, quando ruas da cidade eram fechadas. Construiu mais de 250 quilômetros de ciclorutas permanentes, que também servem para a caminhada de pedestres.