A economia brasileira segue surpreendendo. O crescimento de 0,9% do PIB no terceiro trimestre em relação aos três meses imediatamente anteriores indica que a soma de todas as riquezas produzidas no país vai avançar mais de 3% no fechamento do ano, muito acima das projeções iniciais. No começo de 2024, o consenso do mercado era de uma alta de apenas 1,5%. O desempenho entre julho e setembro foi puxado pelo consumo das famílias e pelo investimento. O mercado de trabalho também permanece forte, com o desemprego nas mínimas históricas da série atual do IBGE. A renda, da mesma forma, sobe acima da inflação.
Um freio estrutural nos gastos contribuiria para a continuidade do avanço do PIB de maneira sustentável e duradoura
O ritmo da economia muito além do esperado, por outro lado, reacende sinais de alerta. Cogita-se que o PIB estaria crescendo acima do seu potencial. Ou seja, de uma maneira que gera inflação. Não se trata de mau agouro, má vontade ou torcida do tipo “quanto pior, melhor”. Pode parecer contraditório, mas as advertências são somente uma preocupação genuína com o risco de solavancos e de uma reversão abrupta do bom momento. O cenário de relativa bonança seria ideal para o governo encaminhar medidas robustas para conter o avanço dos gastos e estabilizar o crescimento da dívida pública nos próximos anos. O impulso fiscal à economia, afinal, não se faz necessário, como vêm mostrando os números consistentes do PIB trimestre a trimestre.
O Palácio do Planalto, como se sabe, optou por um conjunto de medidas que foi considerado por especialistas como insuficiente para garantir o ajuste necessário das contas. Como resultado, os juros futuros dispararam e o dólar ultrapassou a barreira psicológica dos R$ 6. O IPCA em 12 meses está em 4,75%, acima do teto da meta da inflação. O resultado da equação indica que o Banco Central deve apertar o passo no aperto monetário, com uma alta de 0,75 ponto percentual na Selic neste mês, o que elevaria o juro básico da economia para 12%. Péssimo para a atividade econômica, para o investimento produtivo e para o crédito. Os efeitos de uma mudança na política monetária, deve-se lembrar, costumam ser mais sentidos em um período de seis a nove meses após o início de um novo ciclo.
O governo, portanto, desperdiçou a oportunidade de fazer o ajuste do tamanho exigido no momento em que a economia sentiria menos. A proposta de emenda à Constituição (PEC) com as medidas de corte de gastos, de qualquer forma, foi enviada ao Congresso na noite de segunda-feira. Embora o tempo de análise seja exíguo diante da necessidade de votar os temas ainda neste ano, espera-se que a Câmara e o Senado não diminuam a potência das medidas e, pelo contrário, aperfeiçoem o que for possível. A reforma da renda sinalizada pelo governo, comprometeram-se os presidentes das duas Casas, não será tratada neste momento. São temas que não podem se misturar. A responsabilidade do parlamento neste momento de hesitação do Executivo é vital.
O que está em jogo é o risco de mais um voo de galinha na economia. Um freio estrutural nos gastos, por outro lado, recuperaria a confiança dos agentes, voltaria a ancorar as expectativas para a inflação e contribuiria para a continuidade do avanço do PIB de maneira sustentável e duradoura, a taxas razoáveis e com a manutenção do desemprego baixo. É esse o crescimento que o país precisa.