Mito é mentira, por definição. Entre as acepções do dicionário, estão a de “ideia falsa sem correspondente na realidade” e “representação de fatos ou personagens reais, exagerada pela imaginação popular”. A chamada mitomania, um distúrbio psiquiátrico, é a compulsão de mentir — que pode ir da inocente contação de histórias fantasiosas por exibicionismo ou busca de atenção até a criação e divulgação de inverdades com propósitos criminosos, prática comum em períodos eleitorais.
A mitologia, a história dos deuses da Antiguidade greco-romana, continua sendo uma leitura fascinante e simbólica na revelação dos vícios e das virtudes dos humanos. Somos seres fabuladores. O grande Vargas Llosa tem um ensaio chamado A Verdade das Mentiras, no qual explica bem por que damos tanta corda à imaginação: a vida é curta demais, precisamos viver outras vidas e a ficção nos oferece esta oportunidade.
No livro As 100 Melhores Histórias da Mitologia, que estou lendo com muito prazer neste agosto de luzes e sombras, os gaúchos Carmen Seganfredo e A.S. Franchini recontam os mitos clássicos com descontração e humor, no formato de contos, mas sem se afastar da verdade histórica – que, afinal, também poderia ser chamada de mentira histórica. Como quem conta um conto aumenta um ponto, eles acrescentam cacos deliciosos às lendas.
— Este Prometeu promete! — teria dito o pai do titã quando ele era criança, por exemplo.
Prometeu, filho de Japetos e neto de Urano e Gea (o Céu e a Terra), é um dos personagens mais instigantes da mitologia. Ele é descrito como criador do homem (do homem, não da mulher) e também como o herói moleque que roubou o fogo dos deuses para garantir luz e calor à humanidade. Numa decisão monocrática e vingativa, o então presidente do Supremo, ou melhor, do Olimpo, aplicou-lhe a condenação eterna de ficar acorrentado a uma rocha, com o castigo suplementar da águia que o visitava diariamente para bicar-lhe o fígado.
A pena eterna acabou sendo abreviada, não por graça presidencial, mas sim pela ação de outro bombado, Hércules, que usou sua força descomunal para abater a águia e romper as correntes. No livro, os imaginativos autores fazem mais um acréscimo à história original, atribuindo-o à esperteza de Prometeu. Para não desautorizar o todo-poderoso Júpiter, ele sugeriu a Hércules que fizesse um anel da corrente rompida e incrustou nele uma partícula do rochedo, de modo que pudesse ficar livre sem se afastar da pedra.
Foi, portanto, o precursor da tornozeleira eletrônica.